São Paulo, terça-feira, 11 de agosto de 2009

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Ang Lee filma festival em tom banquinho e violão

SILVANA ARANTES
DE BUENOS AIRES

"Venho de um lugar cuja própria definição é muito complicada. Não é uma nação. Não é sequer um país. É humilhante. Você convive com isso e espera que seja aceitável. Por essa razão, Woodstock é tão precioso para mim. Em Woodstock, tudo era aceitável."
Essa é a explicação do cineasta Ang Lee sobre a decisão de filmar "Aconteceu em Woodstock", longa baseado em livro de Elliot Tiber ("Taking Woodstock"). O filme concorreu no Festival de Cannes, em maio, onde Lee conversou com a Folha. A estreia no Brasil está prevista para janeiro de 2010.
Filho de chineses que "escaparam do comunismo indo para Taiwan", Lee viveu até os 21 anos em seu "humilhante" não país, até que decidiu pós-graduar-se em artes nos EUA, onde construiu uma carreira de sucessos que incluem "O Tigre e o Dragão" e "O Segredo de Brokeback Mountain".
Numa entrevista à TV para divulgar um de seus filmes, o cineasta conheceu Tiber, que falava sobre seu livro, com o qual presenteou Lee.
Em "Taking Woodstock", Tiber narra a história por trás dos shows. Jovem gay filho de austeros imigrantes para quem não tinha coragem de revelar sua homossexualidade, ele tenta salvar da bancarrota o decadente hotel da família.
Com um golpe de sorte e uma dose de inconsequência, Tiber acaba fechando o contrato para abrigar os shows de rock e atrai para a região o público hippie que a cidade vizinha rechaçara.

"Cultura repressiva"
"Assim como esse cara [Tiber], eu cresci numa cultura repressiva", aponta Lee. Por isso, embora o filme seja predominantemente uma comédia, o diretor diz: "Não pude evitar ter um tom melancólico também. O tempo de descobrir a liberdade e a aceitação é também o tempo de dizer adeus aos seus pais, de cortar os laços".
Lee afirma que, apesar de ter grande interesse "no impacto social de Woodstock e na era que ele sintetiza", só conseguiria abordar o assunto no cinema se fosse "por uma perspectiva pessoal, das mudanças que Woodstock provocou na vida de um indivíduo".
Além disso, se Woodstock, e não Tiber, fosse o protagonista de "Aconteceu em Woodstock", Lee se veria diante da "impossibilidade de reproduzir os shows e escalar um número inimaginável de figurantes".
Com a escolha de contar uma história íntima do episódio, Lee fez um filme sobre Woodstock num tom banquinho e violão.
Para interpretar Tiber, ele escalou o humorista Demetri Martin, uma espécie de Marcelo Adnet americano, cujo trabalho conheceu pelo YouTube ("Jokes With Guitar").
Martin acentua o viés cômico do filme. Lee diz que a predominância desse tom está relacionada ao fato de que "Woodstock teve um final feliz: não tinha banheiro nem comida [suficientes], havia um medo constante de ser eletrocutado, mas eles fizeram aquilo sem registro de violência".
Na opinião do cineasta, a "essência otimista" daqueles dias de show "se perdeu". Ainda assim, ele vê ecos da era "que iniciou toda a luta pela igualdade dos direitos humanos" na eleição de Barack Obama nos EUA.
"Meu filho faltou à aula para ir à posse de Obama. Eu dizia: "O que você está fazendo aí? São milhões de pessoas. Não dá para ver nada". E um amigo comentou: "É como ir a Woodstock. É um momento histórico. Você tem que participar"."


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