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Ang Lee filma festival em tom banquinho e violão
SILVANA ARANTES
DE BUENOS AIRES
"Venho de um lugar cuja própria definição é muito complicada. Não é uma nação. Não é
sequer um país. É humilhante.
Você convive com isso e espera
que seja aceitável. Por essa razão, Woodstock é tão precioso
para mim. Em Woodstock, tudo era aceitável."
Essa é a explicação do cineasta Ang Lee sobre a decisão de
filmar "Aconteceu em Woodstock", longa baseado em livro
de Elliot Tiber ("Taking
Woodstock"). O filme concorreu no Festival de Cannes, em
maio, onde Lee conversou com
a Folha. A estreia no Brasil está
prevista para janeiro de 2010.
Filho de chineses que "escaparam do comunismo indo para Taiwan", Lee viveu até os 21
anos em seu "humilhante" não
país, até que decidiu pós-graduar-se em artes nos EUA, onde construiu uma carreira de
sucessos que incluem "O Tigre
e o Dragão" e "O Segredo de
Brokeback Mountain".
Numa entrevista à TV para
divulgar um de seus filmes, o
cineasta conheceu Tiber, que
falava sobre seu livro, com o
qual presenteou Lee.
Em "Taking Woodstock", Tiber narra a história por trás dos
shows. Jovem gay filho de austeros imigrantes para quem
não tinha coragem de revelar
sua homossexualidade, ele tenta salvar da bancarrota o decadente hotel da família.
Com um golpe de sorte e
uma dose de inconsequência,
Tiber acaba fechando o contrato para abrigar os shows de
rock e atrai para a região o público hippie que a cidade vizinha rechaçara.
"Cultura repressiva"
"Assim como esse cara [Tiber], eu cresci numa cultura repressiva", aponta Lee. Por isso,
embora o filme seja predominantemente uma comédia, o
diretor diz: "Não pude evitar
ter um tom melancólico também. O tempo de descobrir a liberdade e a aceitação é também
o tempo de dizer adeus aos seus
pais, de cortar os laços".
Lee afirma que, apesar de ter
grande interesse "no impacto
social de Woodstock e na era
que ele sintetiza", só conseguiria abordar o assunto no cinema se fosse "por uma perspectiva pessoal, das mudanças que
Woodstock provocou na vida
de um indivíduo".
Além disso, se Woodstock, e
não Tiber, fosse o protagonista
de "Aconteceu em Woodstock", Lee se veria diante da
"impossibilidade de reproduzir
os shows e escalar um número
inimaginável de figurantes".
Com a escolha de contar uma
história íntima do episódio, Lee
fez um filme sobre Woodstock
num tom banquinho e violão.
Para interpretar Tiber, ele
escalou o humorista Demetri
Martin, uma espécie de Marcelo Adnet americano, cujo trabalho conheceu pelo YouTube
("Jokes With Guitar").
Martin acentua o viés cômico
do filme. Lee diz que a predominância desse tom está relacionada ao fato de que "Woodstock teve um final feliz: não tinha banheiro nem comida [suficientes], havia um medo
constante de ser eletrocutado,
mas eles fizeram aquilo sem registro de violência".
Na opinião do cineasta, a "essência otimista" daqueles dias
de show "se perdeu". Ainda assim, ele vê ecos da era "que iniciou toda a luta pela igualdade
dos direitos humanos" na eleição de Barack Obama nos EUA.
"Meu filho faltou à aula para
ir à posse de Obama. Eu dizia:
"O que você está fazendo aí? São
milhões de pessoas. Não dá para ver nada". E um amigo comentou: "É como ir a Woodstock. É um momento histórico.
Você tem que participar"."
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