São Paulo, segunda-feira, 11 de setembro de 2000

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LITERATURA
"Seres Imaginários" de Borges merecia ilustrações à altura

CYNARA MENEZES
ESPECIAL PARA A FOLHA

"O Livro dos Seres Imaginários", de Jorge Luis Borges, está sendo reeditado pela Globo, e isso é razão de alegria para os leitores do argentino: é todo um clássico. Mas também de certo desapontamento -por que as ilustrações da edição húngara?
Não que elas sejam más, mas que tinha outras opções, isso tinha. No final do ano passado, por exemplo, no Palácio de Belas Artes do México, foi inaugurada uma exposição que percorreria 17 países com as pinturas do artista mexicano Francisco Toledo inspiradas na "Zoologia Fantástica" borgiana -o livro se chamava assim quando surgiu, em 1957, e trocou de nome em 67 ou 68.
As pinturas de Toledo já haviam ilustrado outra edição do livro de 1984, pelo mesmo Fundo de Cultura Econômica do México que lançou a obra há mais de 40 anos. Esse livro, felizmente, ainda está disponível em algumas livrarias brasileiras, em espanhol.
Por meandros do mercado editorial, a Globo, que detém os direitos de publicação do autor no Brasil e que já lançou suas "Obras Completas", optou pelas gravuras da edição feita em Budapeste, sem nenhum crédito do autor.
Menos mal que as traduções foram revistas e retraduzidos os poemas citados por Borges no livro, escrito com sua amiga Margarita Guerrero. Nele, o escritor elabora um compêndio dos seres imaginários em diferentes partes do mundo e em diferentes épocas, na literatura ou fora dela.
Aí aparecem desde os "trolls" da tradição escandinava até os dragões chineses; dos "nagas" do Industão (serpentes que assumem forma humana) até o grego Minotauro; da egípcia esfinge ao "borametz" tártaro (espécie de cordeiro vegetal). Espanta como os autores "esnobam" os seres fantásticos da mitologia americana. Apenas os EUA têm a honra, no Novo Mundo, de fornecer verbetes para o livro, com personagens imaginados por lenhadores e com o "Haokah", o deus do trovão sioux.
Os cronistas das Índias, com seus seres fabulosos, ou mesmo os mitos e deuses pré-colombianos são ignorados. Da Argentina, sai um verbetezinho, sobre a "porca das correntes" -uma fêmea suína que, ao norte de Córdoba, arrastava correntes nos trilhos dos trens e desaparecia.
A ausência da América no livro não chega, porém, a empanar seu brilho. Borges destila erudição, inspirado na tradição islâmica e na Cabala, na literatura chinesa, nos clássicos gregos e latinos, na Idade Média e no Renascimento.
Impossível não considerar ótimo o relançamento, mas a Globo fica devendo uma edição com ilustrações mais à altura dos seres relembrados por Borges.

O Livro dos Seres Imaginários
     Autores: Jorge Luis Borges e Margarita Guerrero Tradução: Carmen Vera Cirne Lima Editora: Globo Quanto: R$19,50 (206 págs.)


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