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"O MERCADO DO GOZO"
Escrito a partir do improviso dos atores, roteiro de espetáculo se perde em detalhes e gira em falso
Companhia do Latão não vai além do ensaio
SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA
A Cia. do Latão impressiona
pela clareza. Não sobe ao
palco para compartilhar dúvidas,
mas para demonstrar certezas.
Tem como paradigma o Brecht
didático e, utilizando o seu "organon" como instrumento de precisão, propõe em suas montagens
expor questões incômodas e urgentes da sociedade brasileira.
Em "O Mercado do Gozo", a direção musical, que se apóia em
delicadas composições originais e
na voz segura do elenco, faz com
que se pense em "The Cradle Will
Rock", musical sindicalista de
Marc Blitzstein, que originou filme ("O Poder Vai Dançar").
É como se a Cia. do Latão fosse
um inesperado braço brasileiro
dessa "Broadway vermelha". Resultado de extensas oficinas multidisciplinares, ilustração de discussões públicas, o espetáculo, no
entanto, não empolga -e dá a
entender que é por opção estética.
Afinal, a didática brechtiana se
aplica antes de tudo aos atores, e
não ao público, cuja presença a rigor é dispensável. Não se busca
comover, mas entender racionalmente através da ação teatral. Por
esse princípio, policia-se a emoção: ninguém goza em serviço.
Helena Albergaria, atriz sensível
e profunda, tem que se expressar
por sistemáticas caras de choro; a
forte presença de Victoria Camargo se deságua em gritos. Ney Piacentini e Beto Mattos mostram a
habitual eficácia de coringas, mas
Emerson Rossini faz o herdeiro
da fábrica de tecidos ir da revolta à
orgia sem mover um músculo.
Com uma dramaturgia escrita
"na sala de ensaio, a partir do improviso dos atores", o roteiro se
perde em detalhes e gira em falso,
com algumas inovações pontuais
ofuscadas por efeitos gratuitos.
Reduzido a figurantes de cinema, a quem se adverte para não
reagir, o público é menosprezado
como um intruso, incapaz de entender a fina massa que se fabrica
nessa companhia. Disfarçando,
pois, o tédio para não parecer reacionário, o público espera com
paciência merecer da próxima vez
da competente Cia. do Latão algo
além de um ensaio.
O Mercado do Gozo
Texto e direção: Márcio Marciano e
Sérgio de Carvalho
Com: Cia. do Latão
Onde: teatro Cacilda Becker (r. Tito, 295,
SP, tel. 0/xx/11/3864-4513)
Quando: de qui. a sáb., às 21h; dom., às
19h; até 26/10
Quanto: de R$ 5 a R$ 10
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