São Paulo, sexta-feira, 12 de janeiro de 2007

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Crítica/erudito

Quarteto Brasileiro de Violões faz gravação histórica de Albéniz

ARTHUR NESTROVSKI
ARTICULISTA DA FOLHA

O disco é tão bom que até dá receio de fazer um elogio, para não prejudicar. Mas o mínimo que se deve dizer é que essa gravação da "Suíte Ibéria", de Albéniz (1860-1909), pelo Quarteto Brasileiro de Violões, recém-lançada pelo selo americano Delos, passa a ser uma das gravações de referência da obra-prima do compositor catalão.
Para ser bem claro: um registro de interesse geral, não só para os amantes do violão.
Há nisso uma justiça mais que poética. Composta para piano, "Ibéria" tem por dentro uma espécie de violão ideal, sonhado, uma espantosa guitarra espanhola que vai se dividindo em outras à medida que a música progride, com suas mil fantasias timbrísticas e contrapuntísticas. E é justamente esse violão que se escuta agora, na transcrição do Quarteto, como se fosse a tradução da tradução, reconduzindo a música à sua origem.
A gravação coroa a trajetória do grupo, mais conhecido hoje como Brazilian Guitar Quartet.
De 2000 para cá, eles fizeram mais de 200 concertos mundo afora: EUA, Europa, Japão, Hong Kong, Porto Rico. Onde menos tocaram foi no Brasil -só quatro ou cinco vezes-, o que precisa ser reparado.
Da formação original participavam Everton Gloeden (do Centro Tom Jobim) e Tadeu do Amaral (principal responsável pelas transcrições), mais Edelton Gloeden (USP) e Paul Galbraith (hoje em carreira solo).
Os dois últimos seriam substituídos por Edson Lopes (Conservatório de Tatuí) e Luiz Mantovani (Universidade Estadual de Santa Catarina).
Foi Galbraith, inspirado no arcaico "orpharium", quem desenvolveu um novo violão de oito cordas, uma mais aguda que a primeira corda do violão clássico, outra mais grave que a mais grave. Tocado em pé, como um violoncelo, esse violão, ou melhor, um par desses violões, foi crucial para a elaboração do repertório do Quarteto.
Sonoramente, os violões juntos se aproximam, assim, da gama de um quarteto de cordas, só faltando as notas mais agudas do violino (acima do dó 5).
Resolvida a tessitura, faltava criar o repertório. Nos três discos anteriores, o Quarteto gravou desde transcrições inéditas de compositores brasileiros (o "Quarteto de Cordas nš 2" de Camargo Guarnieri, por exemplo) até as "Suítes Orquestrais" de Bach. A experiência acumulada converge para essas transcrições de Albéniz, numa interpretação de tirar o fôlego, não só pelo virtuosismo mais exuberante, em passagens rápidas e ritmos sincopados, mas também pelo virtuosismo de outra ordem, no controle muito fino dos tempos e na qualidade especial dos timbres, em planos sobrepostos.
Em 2000, o pianista Daniel Barenboim tocou memoravelmente dois cadernos de "Ibéria" na Sala São Paulo. Seu Albéniz parecia um precursor genial dos modernistas Ravel e Messiaen; e mais até do que Alicia de Larrocha, reverenciada pelo Quarteto, é em Barenboim que esse disco faz pensar. Eles ficam, agora, nessa companhia, sob o sol ideal de "Ibéria", e à sombra de ninguém.


IBÉRIA     
Artista: Brazilian Guitar Quartet
Lançamento: Delos
Quanto: US$ 13,29 (R$ 28,64, sem taxas), no www.cduniverse.com


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