|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Novos estudos desmontam estereótipos de Marilyn Monroe e das irmãs Brönte
Mitos transfigurados
CARYN JAMES
DO "NEW YORK TIMES"
Nos anos 50, ainda viva, Marilyn
Monroe era vista como parte boneca travessa, parte sedutora. Nos
anos 70 e 80, sob a égide do feminismo, Marilyn, já morta, passou
a ser vista como vítima do patriarcado, enquanto os anos 90 pós-feministas a reinventaram como
uma loira não tão burra que usou
seu poder astuciosamente. Quando uma vida termina envolta em
mitos a ponto de impedir que a
pessoa que a viveu seja vislumbrada, é hora de os críticos começarem a analisar os mitos.
Essa abordagem é empregada
de maneira reveladora no estudo
de Sarah Churchwell sobre as mudanças na imagem de Marilyn,
"The Many Lives of Marilyn
Monroe" (as muitas vidas de
Marilyn Monroe, Metropolitan
Books), e no envolvente "The
Brönte Myth" (o mito Brönte,
Anchor Books), de Lucasta Miller.
Como Miller diz, Charlotte e
Emily Brönte se tornaram inicialmente conhecidas como autoras
dos escandalosos "Jane Eyre" e
"O Morro dos Ventos Uivantes",
e suas reputações foram vasculhadas e reavaliadas desde então.
O que os dois livros oferecem
não é uma versão mais verdadeira
de Monroe ou das irmãs Brönte,
mas uma percepção quanto ao
poder de distorção e o significado
social dos mitos. Como revela cada um dos livros, as imagens mutáveis de seus temas são projeções
de momentos sociais bem definidos. Porque o papel das mulheres
mudou de maneira tão drástica ao
longo dos últimos cem anos, e cada virada cultural tem a capacidade de criar uma visão nova e dramática da vida tomada por tema.
O livro de Churchwell esbanja
bom senso, expondo a lógica circular e as fontes risíveis usadas em
muitas das biografias de Monroe.
Ela computa mais de 60 livros,
bem como 40 filmes, 20 peças, dez
romances e uma ópera que tomam Monroe por tema. A maior
parte dos trabalhos, diz, "reforça
aquilo que acreditamos, e não
aquilo que sabemos".
Churchwell ressalta que a persistente cisão entre Marylin e
Norma Jeane é fruto de teimosia.
A inocente Norma Jeane, a suposta "personalidade real" que se tornou Marilyn Monroe, produto de
Hollywood, é apenas mais um estereótipo sentimentalóide.
Miller expõe as Brönte com a
mesma clareza abrangente. "The
Brönte Myth" nos lembra dos
motivos para que "Jane Eyre" e
"O Morro dos Ventos Uivantes"
fossem considerados tão chocantes no passado. Na década de
1840, o desejo feminino parecia
pouco respeitável, mesmo quando descrito em termos românticos e metafóricos, como é o caso
no trabalho das Brönte.
A natureza chocante dos romances das Brönte logo desapareceu, mas imagens exageradas
das autoras se solidificaram, muitas vezes misturando as personalidades das escritoras com visões
simplistas de suas heroínas. Charlotte devia ser Jane Eyre em pessoa, e Emily, a mulher tresloucada
percorrendo as charnecas do
morro dos Ventos Uivantes.
Todos esses mitos apontam para um profundo anseio pelo que
esses livros dizem que jamais poderemos ter: uma história coerente sobre uma vida, que responda a
todas as perguntas, para sempre,
meta tão ilusória quanto a de
qualquer conto de fadas.
Tradução Paulo Migliacci
Texto Anterior: Programação de TV Próximo Texto: Mônica Bergamo Índice
|