São Paulo, sábado, 12 de fevereiro de 2005

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Novos estudos desmontam estereótipos de Marilyn Monroe e das irmãs Brönte

Mitos transfigurados

CARYN JAMES
DO "NEW YORK TIMES"

Nos anos 50, ainda viva, Marilyn Monroe era vista como parte boneca travessa, parte sedutora. Nos anos 70 e 80, sob a égide do feminismo, Marilyn, já morta, passou a ser vista como vítima do patriarcado, enquanto os anos 90 pós-feministas a reinventaram como uma loira não tão burra que usou seu poder astuciosamente. Quando uma vida termina envolta em mitos a ponto de impedir que a pessoa que a viveu seja vislumbrada, é hora de os críticos começarem a analisar os mitos.
Essa abordagem é empregada de maneira reveladora no estudo de Sarah Churchwell sobre as mudanças na imagem de Marilyn, "The Many Lives of Marilyn Monroe" (as muitas vidas de Marilyn Monroe, Metropolitan Books), e no envolvente "The Brönte Myth" (o mito Brönte, Anchor Books), de Lucasta Miller.
Como Miller diz, Charlotte e Emily Brönte se tornaram inicialmente conhecidas como autoras dos escandalosos "Jane Eyre" e "O Morro dos Ventos Uivantes", e suas reputações foram vasculhadas e reavaliadas desde então.
O que os dois livros oferecem não é uma versão mais verdadeira de Monroe ou das irmãs Brönte, mas uma percepção quanto ao poder de distorção e o significado social dos mitos. Como revela cada um dos livros, as imagens mutáveis de seus temas são projeções de momentos sociais bem definidos. Porque o papel das mulheres mudou de maneira tão drástica ao longo dos últimos cem anos, e cada virada cultural tem a capacidade de criar uma visão nova e dramática da vida tomada por tema.
O livro de Churchwell esbanja bom senso, expondo a lógica circular e as fontes risíveis usadas em muitas das biografias de Monroe. Ela computa mais de 60 livros, bem como 40 filmes, 20 peças, dez romances e uma ópera que tomam Monroe por tema. A maior parte dos trabalhos, diz, "reforça aquilo que acreditamos, e não aquilo que sabemos".
Churchwell ressalta que a persistente cisão entre Marylin e Norma Jeane é fruto de teimosia. A inocente Norma Jeane, a suposta "personalidade real" que se tornou Marilyn Monroe, produto de Hollywood, é apenas mais um estereótipo sentimentalóide.
Miller expõe as Brönte com a mesma clareza abrangente. "The Brönte Myth" nos lembra dos motivos para que "Jane Eyre" e "O Morro dos Ventos Uivantes" fossem considerados tão chocantes no passado. Na década de 1840, o desejo feminino parecia pouco respeitável, mesmo quando descrito em termos românticos e metafóricos, como é o caso no trabalho das Brönte.
A natureza chocante dos romances das Brönte logo desapareceu, mas imagens exageradas das autoras se solidificaram, muitas vezes misturando as personalidades das escritoras com visões simplistas de suas heroínas. Charlotte devia ser Jane Eyre em pessoa, e Emily, a mulher tresloucada percorrendo as charnecas do morro dos Ventos Uivantes.
Todos esses mitos apontam para um profundo anseio pelo que esses livros dizem que jamais poderemos ter: uma história coerente sobre uma vida, que responda a todas as perguntas, para sempre, meta tão ilusória quanto a de qualquer conto de fadas.


Tradução Paulo Migliacci


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