São Paulo, sábado, 12 de fevereiro de 2005

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"O GRANDE INIMIGO - A HISTÓRIA SECRETA DO CONFRONTO ENTRE CIA E KGB"

Autores desmistificam vida de espião

RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL

Espiões são uma das matérias-primas mais populares da indústria de entretenimento. Basta ver o sucesso de filmes como os de 007 ou da obra de John Le Carré ("O Espião que Veio do Frio"). Na vida dita real os fatos são mais prosaicos, mas existe uma tendência de autores de não-ficção de exagerar os resultados obtidos com a espionagem.
O grande mérito deste livro é desmistificar o cotidiano do espião, embora de vez em quando os autores escorreguem e inflacionem um pouco o impacto da espionagem na Guerra Fria, entre o Ocidente capitalista liderado pelos EUA e o bloco comunista da finada União Soviética.
Mas este é um pecado menor, que afinal contamina todo o gênero de memórias de espião ou histórias da espionagem. E é compreensível, pois um dos autores, Milt Bearden, trabalhou por cerca de 30 anos na CIA. O outro autor, James Risen, é jornalista, cobrindo a área de segurança internacional para o "New York Times", e um dos ganhadores do Prêmio Pulitzer pela cobertura dos atentados de 11 de Setembro de 2001 nos EUA.
Livros de espionagem costumam dar muito mais atenção aos meios do que aos fins. As aventuras "de capa-e-espada" são mais interessantes do que a vida de um analista diante do computador.
Um dos pontos altos do livro, e da carreira de Bearden, foi seu trabalho com guerrilheiros afegãos em luta contra as forças de ocupação soviética. O relato mescla aventura até mesmo com humor, quando conta a entrega de uma "arma secreta" aos guerrilheiros muçulmanos: mulas. A guerra no Afeganistão envolvia terreno muito acidentado, e só mulas eram capazes de transportar as armas mais pesadas e os suprimentos necessários ao combate.
Um bom corretivo a essa tendência glorificadora da espionagem foi o livro de 2003 "Intelligence in War: Knowledge of the Enemy from Napoleon to Al-Qaeda" (a inteligência na guerra: conhecimento do inimigo, de Napoleão à Al-Qaeda"), do historiador militar britânico John Keegan. Keegan deixa claro que a informação é apenas mais uma arma na mão do comandante e que no fundo é o combate que determina o resultado de um conflito.
Bearden e Risen acabam demonstrando essa tese com os exemplos do livro. Um dos espiões que mais ajudou os EUA era um engenheiro aeronáutico que revelou detalhes importantes dos mais modernos aviões de caça russos. Mas isso não teria significado nada se os americanos não tivessem uma indústria aeronáutica e eletrônica superior. E, como tinham, o fato de conhecer os parâmetros técnicos dos aviões soviéticos era quase irrelevante.
Já o papel da CIA no Afeganistão foi mais vital. Não se tratava de coligir informação, mas sim de dar apoio material à guerrilha. A entrega de mísseis antiaéreos portáteis Stinger, por exemplo, arrasou com a força aérea soviética. Palavras e documentos ajudam a ganhar uma guerra, mas quem a decide é o soldado em combate.


O Grande Inimigo - A História Secreta do Confronto entre CIA e KGB
   
Autor: Milt Bearden e James Risen
Editora: Objetiva
Quanto: R$ 66,90 (567 págs.)


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