São Paulo, sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

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A tragédia da vez

Indicação de "Preciosa", de Lee Daniels, para concorrer a seis Oscars confirma tendência de Hollywood de valorizar desgraças e catástrofes emocionais

FERNANDA EZABELLA
ENVIADA ESPECIAL A LOS ANGELES

Em Hollywood, entretenimento pode significar muita choradeira. É o caso de "Preciosa - Uma História de Esperança", filme que atinge nota máxima no quesito catástrofe emocional. Não à toa, concorre a seis Oscars, incluindo melhor filme e diretor, confirmando a vocação dos prêmios para escolher uma história de desgraça a cada ano.
"Preciosa" também traz ineditismos: Lee Daniels é o primeiro negro a dirigir um longa indicado ao Oscar de melhor filme e a produzir um trabalho ganhador de uma estatueta, "A Última Ceia" (2001), recebida por Halle Berry, primeira negra com o prêmio de melhor atriz.
Baseado em livro da autora americana Sapphire, "Preciosa" conta o drama de uma garota negra de 16 anos, pobre, obesa e analfabeta, moradora do Harlem, em Nova York. É mãe de dois filhos, um com síndrome de Down e ambos resultado de estupro do pai. Ainda assim, não perde a imaginação e tem seus momentos quando sonha que é famosa, cheia de glamour.
"Criei esse mundo de fantasia para dar um respiro ao público. Tantas coisas horríveis acontecem com ela no livro, seria pornográfico levar tudo à tela", disse Daniels, 50, à Folha. "Acho que o humor ajuda a digerir a devastação que testemunhamos no filme."
Para conseguir os direitos do livro, Daniels conta que "perseguiu" Sapphire por nove anos. "Nunca tinha lido nada tão verdadeiro, tão brutal. Foi como um murro no estômago."
Este é o segundo longa que Daniels dirige, mas sua experiência em tragédias vem de longa data. O diretor fala abertamente da infância complicada que teve, com o pai abusivo que batia nele e a juventude marcada por drogas que, segundo ele, o levaram a ter um ataque do coração.
Talvez seja esse passado que o tenha feito trilhar por filmes pesados -produziu também "O Lenhador" (2004), no qual Kevin Bacon faz um pedófilo, e estreou na direção com o filme de título autoexplicativo "Matadores de Aluguel" (2006).
"Sou muito atraído por essas coisas [pesadas] a cada filme que passa. É inconsciente. Não planejo fazer filmes obscuros, mas de alguma maneira isso acaba acontecendo", diz Daniels. "Não tenho a resposta."
O filme teve indicações ao Oscar de melhor atriz para Gabourey Sidibe (papel-título) e atriz coadjuvante para Mo'Nique (que faz sua mãe abusiva). Apesar de desconhecidas, elas têm a companhia de duas estrelas, os músicos Lenny Kravitz e Mariah Carey, amigos de Daniels, que fazem pontas como um enfermeiro e uma funcionária do serviço social.
"Entrevistei umas 500 meninas, todas preciosas. Mas Gabourey apareceu e foi incrível. É muito esperta", diz o diretor.
Entre seus próximos projetos há o filme "Miss Saigon", um musical sobre drag queens, e o drama "Selma", sobre as conturbadas passeatas no Alabama pelos direitos civis dos negros, em 1965.
"Estou desenvolvendo várias coisas, mas nada é certo. Sabe, odeio ficar falando, de ficar "zicando'", diz, rindo. "É como falar de Oscar, dá azar! Me deixa muito nervoso, entende?".


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