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São Paulo, quarta-feira, 12 de março de 2003

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CRÍTICA

Nova chance de ver o descobridor do Brasil

XICO SÁ
CRÍTICO DA FOLHA

Disse um certo dia Monteiro Lobato (1882-1948): "Outra coisa não fez Gilberto Freyre senão revelar-nos a nós mesmos, contar o que somos e porque somos assim e não de outro modo".
Muita gente demorou a saber disso, sobretudo por causa da universidade paulista, que tentou atravancar o caminho do homem de "Casa-Grande & Senzala". No Pernambuco do próprio, a peleja também não foi fácil. Ele deslizou no massapê, comeu muito barro, até ser mais ou menos aceito. Como Freyre (1900-1987) mesmo disse, Recife não é de abrir o riso assim para qualquer um.
Freyre sempre foi muito xeleléu do poder de direita no Brasil. E muito bajulado por este. Deu e recebeu. Daí o olho atravessado da USP e principalmente de Pernambuco, terra onde o muro de Berlim caiu por último, graças a Deus. Mas o homem é grande. O cineasta Nelson Pereira dos Santos diz isso direitinho no seu "Gilberto Freyre, o Cabral Moderno", série de quatro programas que o GNT reapresenta nesta semana.
Santos é um destemido. É o mesmo que levou "Vidas Secas", um romance que não carecia do latido e da moda fácil do cinema, às telas. E não fez neo-realismo alagoano à toa. Fez bonito. Com Freyre, descansou um pouco o olho, apostou na narrativa da afetividade máxima. Não busquem grandes planos na série. Joaquim Pedro de Andrade, amigo que sabia filmar literatura, já havia morrido, fez falta.
A afetividade do Cabral moderno ficou por conta do escritor Edson Nery da Fonseca, chegado de Freyre, escolhido para dizer, tintim por tintim, as etapas da obra e dos segredos de "Casa-Grande & Senzala". É a voz do amigo mais próximo que atravessa todo o documentário. Com o dengo das boas histórias. Quase um cafuné de vó na varanda. Ou de um alpendre olindense, de onde se avista o Recife começo do mundo.
Freyre, pelo amigo-mor Fonseca, conta o Brasil que Aldous Huxley, o cabra do admirável mundo novo, definiu, depois de muito licor de pitanga, como "um dos países mais improváveis que tenho conhecido". Os dois se encontraram à sombra de Apipucos, Recife. A lembrança é tirada do livro "O Brasil de Gilberto Freyre", precioso guia de iniciação à obra do pernambucano, do escritor Mário Hélio, com ilustrações de José Cláudio. Livro que carece de edição nacional.
Enquanto isso, Nelson Pereira dos Santos conta a sua história.


Gilberto Freyre, o Cabral Moderno    
Quando: hoje, às 23h20, no GNT



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