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DISCO/CRÍTICA
Música soa verborrágica
da Reportagem Local
Transformado em música, o
"Baghavad Gita" resulta, como
talvez fosse inevitável, verborrágico, discursivo. Perde-se,
nas entranhas musicadas do
poema, o poder catártico dos
refrões, elementos destinados
a fazer a glória de não poucas
canções.
Não é esse, entretanto, o detalhe mais notável do CD
"Canções do Divino Mestre". À
parte a intervenção intelectual
de Carlos Rennó e Cid Campos, o álbum acaba por traçar a
visão excêntrica -deslocada
do centro- de Rogério Duarte
sobre o tropicalismo.
O álbum é pós-tropicalista,
no mesmo sentido em que era
pós-tropicalista a fase "Gita"
(74) de Raul Seixas ou o concretismo zen do "Revolver"
(75) de Walter Franco.
É, nesse sentido, manifesto
de persistência de um ideário
hippie, bicho-grilo mesmo, extraído da tropicália -que, já
após os excessos odara de "Doces Bárbaros" (76, com Caetano, Gal, Gil e Bethânia) e "Bicho" (77, de Caetano), eram
abandonados para sempre pelo "mainstream" tropicalista.
Duarte reinstala o natimorto
"tropicalismo do B", genuíno
prodígio da natureza.
"Canções do Divino Mestre"
é hippie até o osso, em que pese
a contrabalança do virtuosismo da Gal Costa dos 90 ou do
"cerebralismo" arquitetado de
Arnaldo Antunes.
Não por acaso, Caetano está
ausente. Mas paira ainda. Moreno Veloso, o filho, canta "A
Base do Supremo" -você pode pensar que é a voz do pai.
Dos que participam, destacam-se os hippies e/ou
pós-hippies por natureza artística. É o caso de Walter Franco
(em construção que nada fica a
dever a seus velhos hinos viajandões), do neo-hippie Chico
César (incomumente discreto), dos velhos hippies de segunda hora Geraldo Azevedo e
Elba Ramalho -e aqui fica incompreensível a ausência de
Zé Ramalho, expressão perfeita da confluência Nordeste/Oriente que o CD almeja.
Outros lances eficazes são os
de delicadeza, presentes, por
exemplo, nas passagens de
Tom Zé, Jussara Silveira, Ana
Amélia, Tomaz Lima, Lenine.
As notas dissonantes ficam
por conta de Belchior, num indefensável arranjo de igreja, e
Cássia Eller, capaz de fazer
rock'n'roll em ambiente hostil.
Mas ninguém escapa da sina:
na encruzilhada entre poesia e
música, o material faz-se volátil como fumaça de incenso
-ao menos a quem esteja à
procura de música popular.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)
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