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LIVRO/LANÇAMENTO
IMPÉRIO DESAFINADO
Romance acompanha saga de inglês que vai ao sudeste asiático afinar instrumento de excêntrico major
Piano na floresta oferece metáfora à obra
DA REDAÇÃO
Um piano ocidental no meio da
floresta de um país asiático, em
pleno século 19, soa como um forte símbolo do poder de uma potência imperialista. Por outro lado, um piano quebrado apresenta-se, no mínimo, como uma imagem trágica. Já um piano desafinado sugere a idéia de alguém que
perdeu a sua identidade.
"O Afinador de Piano" segue a
trilha da combinação destas três
metáforas. "Acho que o tema do
livro é extremamente atual, num
momento em que "colonialismo" e
"imperialismo" viraram tópicos
tão discutidos", disse Mason em
entrevista à Folha.
"Creio que há aspectos da colonização britânica em Mianmar
que são muito maus, desde a violência usada para anexar a colônia
à destruição de símbolos culturais. Ao mesmo tempo, muitas
das fontes que utilizei foram escritas por homens que estavam com
o Exército britânico, mas tinham
interesse e sensibilidade pela cultura dos birmaneses."
O personagem do major Carroll
surgiu a partir de seu crescente interesse por esses homens de posição ambígua na história. "Tentei
entender como podiam servir a
um governo e a um projeto que
eles devem ter odiado."
O protagonista do livro, Edgar
Drake, chega a seu destino e logra
afinar o piano do major Carroll.
Mas descobre também a violência
por trás do gesto nobre de trazer
Bach para um país subjugado. O
romance o acompanha colhendo
histórias pessoais, apaixonando-se por uma birmanesa e familiarizando-se com mitos e sabores.
Edgar arrasta a afinação do piano por três meses, quando em
condições normais levaria só dois
dias para completar o serviço. Faz
isso para adiar sua partida. Ao final, parece que quem está desafinado é ele mesmo.
Mason diz que sentiu mais ou
menos a mesma coisa quando viveu lá. Edgar é fruto de suas próprias dúvidas e, principalmente,
de sua hesitação em voltar para
casa depois de tão intensa experiência. "Um de meus autores favoritos é Bruce Chatwin [escritor
inglês, autor de "Na Patagônia],
provavelmente porque ele explora essa necessidade inata do homem de sempre continuar a vagar. Acho que é o que Edgar sente,
desde o momento em que inicia
sua viagem, e provavelmente o
que eu sinto e continuo a sentir."
Mason concorda sobre o fato de
"O Afinador de Piano" evocar "O
Coração das Trevas", de Joseph
Conrad (1857-1924), mas acha
que Carroll é bastante diferente de
Kurtz [personagem que, no romance de Conrad, perde a razão e
deixa de obedecer ordens superiores]. "Carroll é muito civilizado", diz. "Ele tomou a missão imperial de espalhar a civilização
muito seriamente e não aprecia o
horror da guerra a seu redor. Enquanto vê no piano uma oportunidade para levar música ocidental a um lugar como a Birmânia,
tanto birmaneses como o Império
Britânico vêem isso apenas no
contexto da guerra. É o aspecto
mais trágico de seu caráter."
Mason acaba de voltar de uma
viagem ao Brasil, por onde passou
por Recife e Bahia. Está reunindo
documentação para seu segundo
romance, que deve abordar o cangaço por aqui. "Os cangaceiros
me interessam pelo fato de serem
cruéis e ainda assim heróicos".
(SYLVIA COLOMBO)
O AFINADOR DE PIANO - ("The Piano Tuner"). Autor: Daniel Mason. Tradução:
Beth Vieira. Editora: Companhia das Letras. Preço: R$ 41 (385 págs.)
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