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São Paulo, sábado, 12 de abril de 2003

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FOUCAULT EM 90 MINUTOS

Biografia vê filósofo sem moralismos

GILBERTO FELISBERTO VASCONCELOS
ESPECIAL PARA A FOLHA

Outros tantos filósofos não tiveram, mas Michel Foucault (1926-1984) teve um badalo midiático e acadêmico de norte a sul, cujo ponto de partida foi o maio de 68 francês, embora nesse ano estivesse na Tunísia dando aulas, com seu amante, curtindo haxixe e "jovens árabes bonitos", coincidindo mais ou menos com a estada lá de Frantz Fanon, o negro psiquiatra revolucionário da Martinica, que amargou, no entanto, um ostracismo autoral por causa de seu terceiromundismo.
A badalação acadêmica, acompanhada de autopromoção, em que os intelectuais franceses são mestres, não é incompatível com valor intelectual. Vá lá a tradução onomástica bárbara: "Fucô" é sem dúvida autor de boas sacadas como saber igual a poder, microfísica do poder (cadeia, escola, hospital psiquiátrico), controle e vigilância do olhar panóptico, mas também é responsável por um relativismo pós-moderno sobre a verdade que descarta a perspectiva das grandes transformações históricas. Não há alternativa. Marxismo, sujeito histórico e proletariado estão mortos.
É um ícone intelectual do nosso tempo, segundo Paul Strathern. Talentoso e apadrinhado por gente graúda, "Fucô" começou a lecionar em 69 no consagrado Collège de France. Após romper com seu primeiro amante, foi lecionar na Suécia, onde comprou um carrão Jaguar, mariscando à noite aventura amorosa. Atraído pelo sublimado Nietzsche, rodou a baiana na gandaia sexual sueca. Mais tarde, em Paris, conheceu um estudante com quem viveu 20 anos, mas sem monogamia.
Aos 40 e poucos anos recebeu herança do pai médico, comprou apê de cobertura onde plantava cannabis e de onde exercitava o binóculo voyeur na vizinhança.
Aí pintou a contracultura californiana nos anos 70. Lá estava "Fucô" dando aulas e pesquisando "nas terras e salões sadomasôs de San Francisco". O sadomasoquismo: dor e prazer. Doidaço. Ácido. Morfina. Atropelado na rua por um carro, declarou que teve um prazer intenso de estar morrendo: "Sempre tive a sensação de que não sinto o prazer. O prazer completo, total, para mim está relacionado com a morte".
Em 1984, morreu de Aids. O moralismo deve ser deixado de lado no julgamento do filósofo e do seu comportamento sexual. Não é toda hora que surge por aí alguém que faz o que gosta na vida.


Foucault em 90 Minutos
    Autor: Paul Strathern Editora: Jorge Zahar Quanto: R$ 12 (88 págs.)



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