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MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
São Paulo
Artigos do "New York Times" não melhoram as periferias, mas refletem o dinamismo e as mudanças da cidade
QUANDO MEU par de sushi predileto finalmente chegou
-salmão com sal marinho e
limão siciliano-, a mesa já havia se
transformado num espetáculo em
technicolor, e discutíamos animadamente sobre São Paulo. À minha
frente, o arquiteto ítalo-brasileiro,
há 17 anos morando em Milão, empenhava-se em recuperar a destreza
no uso do hashi, enquanto ensaiava
elogios à cidade, que lhe parecia
-não sabia precisar o motivo- mais
agradável do que em sua última visita, há um ano.
Mostrei-me logo simpático às
suas observações, eu que há mais de
20 anos deixei o Rio para viver em
São Paulo e ainda me surpreendo a
passear pela cidade como um curioso estrangeiro.
Também morei em Milão e sei
que São Paulo pode exercer enorme
fascínio -ou proporcional desorientação- sobre italianos, não apenas pelas identificações culturais,
mas pelo fato de que na Itália não há
cidade que proporcione, como a capital paulista, a experiência de se viver numa metrópole moderna.
Além disso, para arquitetos europeus, a vertiginosa mobilidade paulistana pode parecer um parque de
diversões diante da relativa estagnação urbana do Velho Continente.
Menos entusiasmado, o casal amigo à minha direita, que há dois anos
trocou a Holanda por um empreendimento na cidade, queixava-se da
desigualdade, da insegurança e das
relações com freqüência corruptas
impostas pela burocracia e seus
agentes paralelos. Para eles o Brasil
é ótimo, mas "para passar férias".
O arquiteto, em sua defesa, lembrou casos escabrosos que viveu em
Milão e citou uma recente reportagem publicada pelo "New York Times" para demonstrar que não estava sozinho em seus elogios à cidade.
Nos últimos anos, o caderno de
viagens do jornal americano parece
ter descoberto São Paulo, a cidade
"por muito tempo ofuscada pelo
Rio". No final do mês passado, o artigo "A selva de concreto de São Paulo" derramava-se em elogios a essa
"beautiful city" (isso mesmo, você
não leu errado) que fervilha com
"novos talentos e idéias arrojadas".
No ano passado, uma outra reportagem do mesmo jornal -"A nova São
Paulo"- já babava diante da "capital
econômica e cultural do Brasil".
É claro que os artigos do "New
York Times" não despoluem os rios
transformados em esgotos ao ar livre, não retiram crianças das ruas
nem melhoram o trânsito ou a vida
das imensas periferias paulistanas.
Mas não deixam de refletir o notável
dinamismo da cidade e o fato de que,
aos poucos, ela vai enfrentando seu
gritante atraso urbanístico.
Da recuperação das áreas do centro, iniciada por Mário Covas, às recentes reformas da prefeita Marta
Suplicy (em que pesem suas dispensáveis malufices), a cidade vai ganhando novos contornos.
Volto para casa à noite, e São Paulo também a mim parece diferente.
Deixei-me embriagar pelo saquê e
pelas opiniões do simpático arquiteto italiano? É possível, mas logo me
dou conta de que uma nova mudança da paisagem vai se tornando perceptível. A Lei da Cidade Limpa está
funcionando! E para o bem -queiram ou não seus detratores.
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