|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Pesquisadores preparam dicionário "histórico"
Projeto, que só será concluído daqui a três anos, recebeu R$ 1 milhão do CNPq
Obra trará 10 mil verbetes e mostrará as diferenças
e evoluções de sentido de termos usados no período colonial no Brasil
RAFAEL CARIELLO
DA REPORTAGEM LOCAL
"E ainda que são contrarios
os Tupiniquins dos Tupinambás, não ha entre elles na lingua
e costumes mais differença, da
que têm os moradores de Lisboa dos da Beira." Ao compararmos o vocabulário e uso que
faziam das palavras os brasileiros dos primeiros séculos de
América portuguesa com os de
hoje, em muitos casos estamos
tão próximos como os tupiniquins e tupinambás desta "Notícia do Brasil" relatada por Gabriel Soares de Sousa em 1587;
em outros, mais diversos que
portugueses e gentios.
É para esclarecer no que nos
aproximamos e no que mudamos, para usos na compreensão da história, sociedade e língua do Brasil, que um grupo de
professores e pesquisadores
universitários de dez instituições do país e uma mais de Portugal preparam, desde o início
deste ano e pelos próximos
três, um dicionário do português colonial.
A empreitada é financiada
pelo CNPq (Conselho Nacional
de Desenvolvimento Científico
e Tecnológico) com a rara verba para pesquisas na área de
humanas de R$ 1 milhão.
A equipe capitaneada pela
professora Maria Tereza Biderman, da Unesp (Universidade
Estadual Paulista), ainda está
no começo dos trabalhos -que
se tornará um dicionário "físico" de mais de 10 mil verbetes e
um banco de dados informatizado-, mas já é possível constatar algumas curiosidades, que
apontam para constâncias e
transformações da sociedade
brasileira.
Se na seara das classificações
botânicas e zoológicas são dois
mundos distintos que se descortinam, se no ramo da economia a abrangência e restrição
de significados permitem
acompanhar sua presença cada
vez mais determinante na vida
social, no campo do direito, cita
a professora, os advogados de
hoje e seus equivalentes do século 16 são tão próximos quanto os moradores de Lisboa e os
da Beira.
"Seria muito interessante [o
uso do futuro dicionário] para
fazer pesquisas sobre o direito
e a administração pública no
Brasil, por exemplo", diz Biderman. "Termos das áreas dos direitos público e privado permanecem iguais hoje aos do século
16; não mudou nada."
A constatação, por enquanto
mera curiosidade, é fruto do
início do trabalho, a partir da
catalogação dos textos -entre
eles, o relato de Gabriel Soares
de Sousa- de que sairão os sentidos, permanências e mudanças de palavras do descobrimento ao século 18.
Biderman diz esperar que
um tal dicionário, inexistente
no país, sirva em primeiro lugar
aos historiadores, mas aposta
que pesquisadores de outras
áreas também poderão fazer
uso do projeto.
O financiamento partiu do
programa "Institutos do Milênio", do CNPq, que busca fomentar pesquisas que envolvam pelo menos três diferentes
universidades do país, de difícil
execução e carentes de recursos maiores. Em 2005, de 236
propostas apresentadas, apenas duas na área de humanas
foram aprovadas.
Texto Anterior: Guilherme Wisnik: Patrimônios pilhados Próximo Texto: Dicionário do Português Colonial Índice
|