São Paulo, Sábado, 12 de Junho de 1999
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ARTES PLÁSTICAS
Bienal italiana, em sua 48ª edição, apresenta obras dos brasileiros Iran do Espírito Santo e Nelson Leirner
Veneza premia Bourgeois e Bruce Nauman

Reuters
Visitante da Bienal de Veneza vê obra do britânico Bruce Nauman


CELSO FIORAVANTE

enviado especial a Veneza


Não faltaram inaugurações nesta 48ª edição da Bienal de Veneza. A primeira delas, na última quarta-feira, para artistas, curadores e convidados em geral, reuniu cerca de 5.000 pessoas, número repetido na quinta-feira, o segundo de três vernissages dedicados a esse público. Ontem foi a vez de o pavilhão brasileiro abrir suas portas para um piquenique nos domínios dos Giardini, em homenagem à representação brasileira.
Hoje acontece a inauguração oficial, para as autoridades, com o anúncio dos premiados deste ano. A Bienal oferece a cada edição dois prêmios para a carreira do artista (Louise Bourgeois e Bruce Nauman, já anunciados), um Leão de Ouro para a melhor participação nacional, o prêmio internacional Bienal de Veneza e quatro menções honrosas.
O Leão de Ouro para a melhor representação nacional bem que poderia ir para o Brasil, seja pela consistente presença (Iran do Espírito Santo e Nelson Leirner), seja pela casualidade de o prêmio ter sido discutido bem em frente ao pavilhão brasileiro, na sombra de uma oliveira, por juízes como o nigeriano Okwui Enwezor (curador da próxima Documenta) e a curadora e editora de arte espanhola Rosa Martinez.
Selecionados pelo curador da próxima Bienal de São Paulo, Ivo Mesquita, Iran do Espírito Santo e Nelson Leirner compõem uma consistente participação brasileira. Aluno e professor, além de gerações diferentes, representam duas vertentes distintas da arte contemporânea do país, mas que, sem preconceito, aproximam-se e distanciam-se de quando em quando.
Nelson Leirner apresentou três instalações. Em uma parede, uma série de Mona Lisas transformadas; na outra, a série "Construtivismo Rural", feita com couros de vaca cortados geometricamente e costurados; no meio, a instalação "O Desfile", composta de centenas de bonequinhos de plástico ou barro representando ícones da cultura brasileira (religiosa, televisiva ou cotidiana; santos da umbanda, personagens de quadrinhos, cobras, lagartos e pinguins de geladeira, entre outros).
Na sala em frente, Iran do Espírito Santo apresentou um desenho sobre a parede, cinco trabalhos da série "Restless" e a sua série de moedas transformadas. A união dos dois no mesmo pavilhão apenas evidenciou mais uma vez as salutares contradições que permeiam a cultura brasileira.
Iran trabalha como um cirurgião, afinado com uma série de assistentes absolutamente indispensáveis ao seu trabalho, como fundidores e vidraceiros (ou seriam vidreiros, como os famosos nativos da ilha vizinha de Murano?). Seu trabalho é preciso e racionalizado. Já o corte de Nelson Leirner parece o do açougueiro. As sobras e restos da cultura lhe interessam. Seu procedimento é mais dionisíaco, embora também nele possa ser sentida uma busca da racionalidade, na organização dos figurantes de sua procissão ou nas composições precisas de seus couros de vaca.
Parece que a herança deixada pelo construtivismo brasileiro realmente é um fato. Mesmo na série "Restless", de Iran, é possível notar algo de construtivo nas diferenças de percepção provocadas pelo vidro transparente, jateado ou espelhado.
O Brasil compareceu ainda por tabela com um terceiro representante: Maurício Dias, que faz dupla com o suíço Walter Riedweg, selecionados pelo próprio curador do evento (o suíço Harald Szeemann).
Apresentaram a videoinstalação "Tutti Veneziani", em que mostram habitantes da cidade em situações íntimas (trocando de roupa, por exemplo). É certo que ali estão presentes questões como as diferentes classes sociais e etnias que compõem a cidade e a discussão do público e do privado (como é próprio da obra dos dois), mas as questões não ganham consistência. Parece que o trabalho foi feito às pressas, sem cuidados técnicos (os personagens não parecem à vontade) ou conceituais (as discussões propostas não avançam). Enfim, um trabalho definitivamente inferior ao apresentado pela dupla de artistas na última Bienal de São Paulo.


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