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DANÇA
Balé da Cidade de São Paulo cria "alternativa artística" para ampliar o limite de vida ativa dos profissionais da área
Companhia 2 recebe bailarinos mais velhos
ESPECIAL PARA A FOLHA
Peças descartáveis nos grupos
"estáveis" de dança, os bailarinos
brasileiros tendem a ser substituídos por volta dos 40 anos de idade. Tal perspectiva vale atualmente para aqueles que não têm vínculo empregatício -uma tendência que cresce cada vez mais,
em contraposição aos que se
transformaram em funcionários
públicos.
Na pauta de discussões dos diretores de companhias de dança,
a vida ativa dos bailarinos é problema que, no dia-a-dia, se mistura às verbas insuficientes e à construção de um repertório atraente.
Para a diretora artística do Balé
da Cidade de São Paulo, Ivonice
Satie, a luta pela sobrevivência à
qual estão submetidos tanto os
bailarinos quanto os coreógrafos,
acaba afetando o rendimento
criativo. "Como têm de dedicar-se a atividades paralelas, acabam
chegando estressados ao estúdio
de ensaios."
Em busca de soluções, Satie
criou no ano passado a Companhia 2 do Balé da Cidade, com o
objetivo de aproveitar a maturidade de bailarinos próximos dos
40 anos. "Trata-se de uma proposta com finalidades artísticas."
"A dança avançou, hoje o intérprete menos jovem pode manter-se em cena, proporcionando novas leituras estéticas", ela diz, salientando que o novo grupo ainda
não garante estabilidade trabalhista ao elenco."
"A condição de funcionário público está desaparecendo, porque
hoje a prefeitura não mais faz
concursos para admitir bailarinos", diz Armando Aurich, 37, e
integrante da Companhia 2 do
Balé da Cidade. Presidente da associação que defende os direitos
do elenco do BCSP, ele acha que é
vital desenvolver leis específicas
para a dança.
"Hoje somos prestadores de
serviços, sem vínculos empregatícios e sem direitos trabalhistas.
Melhores condições e perspectivas futuras influiriam inclusive na
criação. A falta de políticas culturais também prejudica o desenvolvimento de coreógrafos no
Brasil, que não contam com estabilidade mínima para se aprimorar", afirma Aurich, que também
atua como coreógrafo.
Patrocínio e crises
No entanto, apesar das dificuldades, a maioria das companhias
públicas acha que está conseguindo trabalhar sem crises dramáticas, como já ocorreu com o Balé
da Cidade de São Paulo (BCSP),
em fases anteriores.
Fundado em 1968 sob a denominação de Corpo de Baile do
Teatro Municipal de São Paulo, o
Balé da Cidade também costuma
dançar de acordo com os humores políticos, aos quais está sujeito. Subordinado à prefeitura e à
Secretaria Municipal de Cultura,
já foi proibido de se apresentar fora de São Paulo no final dos anos
80, durante a gestão do então prefeito, Jânio Quadros.
Durante mudanças de governo,
e as consequentes trocas de diretores artísticos, também tornou-se comum a paralisação de atividades. Em sua última crise, o Balé
da Cidade foi extinto temporariamente em 1994, por ordem de
Paulo Maluf, prefeito na época,
que se indignou com os protestos
dos bailarinos, descontentes com
os atrasos dos salários.
Resolvido o impasse, o elenco
ganhou fôlego e conseguiu penetrar no mercado internacional,
depois de participar da Bienal de
Lyon (França), em 1996. Mas,
apesar do padrão de qualidade do
elenco, o BCSP ainda apresenta
um repertório irregular.
Dedicado às obras clássicas na
primeira fase de sua trajetória, o
BCSP logo mudou seu perfil,
abrindo-se para a produção contemporânea. Viveu momentos de
grande vitalidade, sob a direção
de Antonio Carlos Cardoso e de
Klauss Vianna.
Com a direção de Satie, o grupo
vem preservando a coesão técnica
e a afinidade com autores brasileiros contemporâneos. "A situação
não é confortável para ninguém e
procuramos fazer o máximo com
o mínimo", diz Satie, que costuma contar com cerca de R$ 300
mil por ano para produzir espetáculos.
Para as próximas temporadas, o
sonho de Satie é trazer o coreógrafo sueco Mats Ek -um dos
criadores mais disputados da
atualidade.
"O difícil será convencê-lo a trabalhar com uma companhia que
ele nunca ouviu falar", ela prevê.
Também adquirir uma obra da
carioca Deborah Colker está nos
planos da diretora.
Paralelamente ao Balé da Cidade, Satie dirige a Companhia de
Danças de Diadema, também vinculada à prefeitura de sua cidade-sede. Fundada há cinco anos, já
surgiu com propostas alternativas
de trabalho, para viabilizar sua
atuação.
"Para ter carteira assinada e
fundo de garantia, os bailarinos
foram contratados como arte-educadores. Além de dançar na
companhia, trabalham na comunidade, dando aulas para a população de baixa renda, crianças ou
idosos."
(ANA FRANCISCA PONZIO)
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