São Paulo, quinta-feira, 12 de agosto de 2004

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TEATRO

Chega ao Brasil "Tierno Bokar", mais recente criação do aclamado diretor inglês; peça narra história de líder espiritual

Brook desconstrói estereótipos africanos

THIAGO GUIMARÃES
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELO HORIZONTE

O diretor inglês Peter Brook, 79, uma das referências do teatro contemporâneo, está no Brasil para acompanhar a apresentação de sua nova montagem, "Tierno Bokar", que integra a programação do 7º Festival Internacional de Teatro Palco e Rua de Belo Horizonte (FIT-BH).
A mais recente criação de Brook desembarca aqui pouco após sua estréia, em junho, na Alemanha. Narra a história do líder espiritual africano Tierno Bokar (1875-1940), cujas palavras acabam por traduzir fragmentos da própria filosofia de trabalho do encenador.
Em entrevista coletiva, anteontem, em Belo Horizonte (MG), Brook repudiou a idéia de um teatro doutrinário, do qual emergem mais respostas do que perguntas. Para isso, recorreu aos ensinamentos de Bokar, que afirmava a existência de três verdades -"A minha verdade, a sua verdade e a verdade". "Quando se aceitam as três verdades, não se acredita mais no autor de teatro, que tem uma visão política, uma ideologia e uma idéia", diz Brook.
"Tierno Bokar" é baseada em "Vida e Ensinamentos de Tierno Bokar - O Sábio de Bandiagara", do etnólogo e filósofo malinês Amadou Hampaté Bâ (1901-1991), discípulo de Bokar e a quem Brook conheceu. O texto foi adaptado para o teatro por Marie-Heléne Estienne, colaboradora permanente de Brook.
Em cena, um elenco de dez atores de diferentes nacionalidades, radicados no Cict (Centro Internacional de Criação Teatral), fundado por Brook em 1974, em Paris. O elenco conta com alguns dos mais antigos atores da companhia, como o africano Sotigui Kouyaté, 67 (como Tierno Bokar), o japonês Yoshi Oida e o inglês Bruce Myers.
A montagem de Brook aborda temas atuais e mundanos, como a violência e a (in)tolerância. Em uma África colonial e moldada pelo islamismo, uma pequena diferença de opinião sobre o número de vezes em que uma oração deveria ser repetida -11 ou 12- deflagra conflitos religiosos e massacres entre a população.
Encenar a trajetória de Bokar, para Brook, significa desconstruir estereótipos criados sobre a África ao longo dos anos. "Considerando que o Brasil não é o país unicamente do samba, a África também não é um continente só de negros, da música e da Aids."
O espetáculo, falado em francês e com uma hora e 40 minutos de duração, reafirma características do teatro brookiano, como a atribuição de diversos papéis ao mesmo ator e a economia de recursos.
O processo de criação, segundo Brook, foi "muito simples". "Inicialmente, não sabíamos como fazer. Tentamos muitas coisas, cometemos erros e continuamos até que tudo que fosse inútil sumisse. É um trabalho de pesquisa."
Brook não gosta de "viver no passado", conforme registrado no documentário "Brook por Brook, um Retrato Íntimo" (2001), dirigido por seu filho Simon. Sobre os rumos de sua pesquisa, disse: "Nunca tento me interrogar dessa forma. Tento apenas trabalhar, seguindo intuições e tentando estar cada vez mais próximo delas. O que muda não sou eu, nem o método, mas o mundo, que muda o tempo todo".


TIERNO BOKAR. Em São Paulo: Sesc Vila Mariana (r. Pelotas, 141, SP, tel. 0/xx/ 11/ 5080-3000). Quando: de 17 a 20/8, às 21h. Quanto: R$ 10 a R$ 30. Em Belo Horizonte (MG): teatro Francisco Nunes (av. Afonso Pena, s/nº, tel. 0/xx/ 31/ 3224-4546). Quando: de 25 a 29/8, às 21h, e 30/8, às 20h. Quanto: R$ 8.


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