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TEATRO
Com mais de 40 peças escritas, autor paulista tem duas em cartaz e ajudou no texto de "Tauromaquia", que estréia hoje
Abreu "narra" drama contemporâneo
VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
No ano em que Nelson Rodrigues morreu, 1980, ele estreou
profissionalmente com "Foi Bom,
Meu Bem?", uma comédia do
grupo Mambembe (1976-1986),
de Santo André, no ABC paulista.
Desde então, atravessando a fase de tintas secas da dramaturgia
nacional, a morte de Plínio Marcos (1935-1999), ícone par de Nelson, e o surgimento de novos autores na virada do milênio para
cá, o fato é que Luís Alberto de
Abreu continua fazendo o que
mais gosta: escrever para teatro.
Ele já está na casa das 40 peças,
entre as quais "Eh, Turtuvia!", um
auto caipira em cartaz com a sua
companheira de 11 anos, a Fraternal Companhia de Artes e Malas-Artes, dirigida por Ednaldo Freire; e "O Auto do Circo", com a caçula Cia. Estável de Repertório,
dirigida por Renata Zhaneta.
Mais um trabalho de Abreu ganha o palco a partir de hoje. Ele
coordenou a dramaturgia de
"Tauromaquia", texto final assinado por Alessandro Toller, 29,
uma das dezenas de jovens escritores que participam de cursos
ministrados pelo autor Brasil afora. A peça, dirigida por Maria
Thaís, estréia no Sesc Anchieta.
Essa é uma das características
desse autor: a generosidade em
transmitir os fundamentos que
ele aprendeu e exercita. "Generosidade, não", corrige Abreu, 52.
"As aulas são um procedimento
natural, inteligente, pois me ajudam a me reciclar com a disponibilidade dos novos escritores."
Abreu atua na Escola Livre de
Teatro (ELT) de Santo André desde o início dos anos 90, convidado
por Celso Frateschi e Maria Thaís,
idealizadores daquele projeto que
segue até os dias de hoje como um
dos exemplos de política pública
de acesso gratuito à formação artística de qualidade.
Há sete anos, coordena o núcleo
de dramaturgia da ELT. É capaz
de lidar com a mesma paixão pela
escrita cênica ao deparar com
moças e rapazes que jamais foram
ao teatro, por exemplo, ou com
aqueles que já iniciaram a caminhada nas artes cênicas, caso do
projeto Oficinão, mantido pelo
grupo Galpão, de Belo Horizonte,
que resultou na montagem de "O
Homem Que Não Dava Seta".
Sobretudo a partir da adaptação
de "Iepe" (1997), dentro da pesquisa da comédia popular com a
Fraternal, a dramaturgia de
Abreu tem sido marcada pela ênfase no teatro narrativo.
"Eu já trabalhava a estrutura
épica em si em textos anteriores,
mas depois o foco se voltou para a
presença do narrador", diz. No
texto, esse procedimento, em linhas gerais, permite ao espectador a distinção da voz do personagem e de quem conta, uma sobreposição de tempo e espaço que
encontra terreno nas comédias e,
talvez com mais complexidade,
nos dramas.
Abreu enveredou por esse terreno em "A Guerra Santa" (1991),
poema encenado por Gabriel Villela dois anos depois; e em "O Livro de Jó" (1995), a segunda peça
da chamada trilogia bíblica do
grupo Teatro da Vertigem.
Na adaptação do poema de fé,
de cunho didático, religioso, no
qual a mulher de Jó desponta apenas com uma fala, torna-se justamente a personagem-contraponto na peça escrita em processo colaborativo com o Vertigem.
"Sua opção por processos coletivos e pelo trabalho de grupo é
um diferencial que faz com que
sua escrita, ainda que apoiada em
premissas da tradição teatral -e
isso nele é vibrante, um trampolim criativo-, mantenha vínculos profundos com as dúvidas do
presente", diz Antônio Rogério
Toscano, atual coordenador-geral
da ELT em Santo André.
"Com a Fraternal, as sobreposições de planos épicos chega à vertigem. Com o Vertigem, ele aproveita a visceralidade e faz uma visitinha a Artaud. Retorna ao histórico para reavaliar as tradições
cênicas com o Galpão e com a cia.
Estável. Curioso, vai até São José
dos Campos e amplifica a sua pesquisa do Nô para fazer "Maria Peregrina". Da mesma forma, chega
aos tiroleses de Piracicaba, reconstrói a cidade de Santo André
ao partir da estrutura de "Nossa
Cidade", de Thorton Wilder. Sem
contar a militância que faz com
que ele se envolva radicalmente
com tudo o que acredita", enumera Toscano, ele também um dramaturgo ("Sacromaquia") que
participou de aulas com Abreu,
como Hugo Possolo, Mário Viana, Marici Salomão, Sérgio Pires,
entre outros.
Difícil é tirar Abreu, morador
em São Bernardo do Campo, de
seu ofício para falar de si, tímido e
recolhido que é, adepto da carpintaria silenciosa das palavras, ainda que plena de ecos dos interlocutores. É com essa cadência que
chegou ao cinema com os roteiros
de "Os Narradores de Javé"
(2000) e "Kenoma" (1998). Ainda
agora, escreve para um renomado
diretor de TV, praia onde pisa pela primeira vez, mas sobre a qual
prefere segredar até o tempo da
colheita.
O AUTO DO CIRCO. Onde: teatro Flávio
Império (r. Prof. Alves Pedroso, 600,
Cangaíba, tel. 6623-2930). Quando: sáb.
e dom.: 20h. Até 17/10. Quanto: entrada
franca
EH, TURTUVIA! Onde: teatro Paulo Eiró (av. Adolfo Pinheiro, 765, Santo Amaro, tel. 5546-0449) Quando: sex. e sáb.: 21h; dom.: 19h; até 31/10. Quanto: R$ 10
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