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Bienal na mira
Curadores, críticos e artistas se dividem em relação à proposta da 28ª edição da exposição, em que não haverá obras de arte exibidas e andar inteiro ficará vazio
FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL
A proposta do curador Ivo
Mesquita de deixar de organizar a 28ª Bienal de São Paulo
num formato tradicional divide
o meio artístico nacional.
O projeto prevê em 2008 um
andar dedicado a uma espécie
de arquivo histórico, com documentos e livros, um andar completamente vazio e o térreo do
pavilhão aberto para performances e exibições de vídeos.
"Acho que é um luto internacional, a conclusão de uma administração ausente e desastrada, o Ivo está fazendo o papel de defunto em um enterro,
é uma cooptação absurda", diz
Nelson Aguilar, curador da 22ª
e da 23ª Bienal de São Paulo.
"Esse é um problema de cidade,
é um erro de todos nós, não só
dos conselheiros, as pessoas
deviam ir para a rua e fazer alguma coisa."
Já Sheila Leirner, curadora
da 18ª e da 19ª edição do evento,
apóia o projeto: "Ivo foi um dos
responsáveis por nossas bienais, tenho confiança no trabalho e nas idéias dele".
Responsável por uma das
edições mais polêmicas da
mostra, em 1985, a curadora vê
semelhança entre os dois projetos. "De forma simbólica talvez à "Grande Tela", e no mesmo 2º andar, afinal teremos, 23
anos depois, o "Grande Vazio".
Nada é mais necessário neste
momento do que o vazio e pode
ser bem mais difícil lidar com o
vazio do que com o cheio."
A proposta de uma "quarentena" para a Bienal agrada alguns críticos e curadores, mas
uma mostra sem arte seria o
ponto fraco do projeto.
"Dada a crise vivida pela fundação, com dívidas financeiras
e simbólicas, como a não-publicação dos catálogos da última
Bienal, o que resta neste curto
espaço de tempo é propor este
"parar para pensar". Cabe sublinhar que a arte vai bem, o público tem comparecido em
massa, o que anda mal das pernas é a instituição, mas uma
coisa é certa: bienal "sem arte" é
triste", afirma o curador e crítico carioca Luis Camillo Osório.
Segundo o curador pernambucano Moacir dos Anjos, "Em
Vivo Contato", nome da 28ª
Bienal, "poderá redefinir a missão da Bienal na contemporaneidade e recuperar a confiança e o respeito esgarçados em
anos recentes".
Edição esvaziada
Mas nem todos os curadores
gostam dessa idéia. "Eu preferiria ver trabalhos de arte que
tratassem do vazio em vez de
encontrar uma Bienal literalmente esvaziada, mas acho que
a curadoria encontrou uma saída inteligente. Discutir estratégias das bienais interessa mais
aos profissionais da arte do que
ao grande público. Espero que a
discussão sobre a instituição
não ofusque a discussão sobre
arte", diz Cauê Alves.
Galeristas também divergem. "Acho admirável o Ivo
aceitar e tentar realizar algo
viável frente ao caos da administração dessa presidência,
mas acho lamentável que seja
roubado de nós um dos poucos
eventos de caráter internacional do país", diz a galerista Márcia Fortes, da Fortes Vilaça.
Para Eduardo Brandão, da
galeria Vermelho, "frente à espetacularização das exposições, acho que é quase óbvio
pensar nesse formato, exposições grandiosas estão falidas".
Entre os artistas, a divisão de
opiniões também ocorre. "A
idéia de um pavilhão vazio já é
em si uma grande atitude artística conceitual", diz Paulo Climachauska. "É uma ampliação
no entendimento do que é uma
bienal, um movimento importante em favor da reflexão e
uma afirmação a respeito do
papel da instituição na cidade e
no circuito artístico internacional", defende Carla Zacagnini.
Maurício Dias, da dupla Dias
& Riedweg, é um dos críticos ao
projeto: "Em São Paulo não faltam bons simpósios e praças vivas, o que falta é vigiar e conter
a sucessão de erros administrativos e políticos da Fundação
Bienal".
"Acho que um processo de
reflexão pode ser bom, mas
pensar criticamente a partir de
documentos históricos, espaços vazios ou abertos à participação requer tempo e intensidade de trabalho e deveria ser
um pressuposto para a realização de uma mostra de arte do
porte da Bienal e não estar no
lugar desta", afirma a artista
paulistana Carmela Gross.
Contudo, segue ela, "enquanto os artistas e suas obras aparecerem como figuração fantasmática dentro uma estrutura fortemente armada em termos não-artísticos, acho difícil
avançarmos".
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