São Paulo, quarta-feira, 12 de novembro de 2008

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Política e intimismo dão o tom no Mix Brasil 2008

Festival da diversidade sexual começa hoje em SP e exibe mais de 200 filmes

Será exibida paródia de "O Segredo de Brokeback Mountain", além de um documentário sobre vida do cineasta Derek Jarman

CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA

Com mais de 200 títulos, entre longas e curtas, e atrações paralelas como o Mix Music, a 16ª edição do Mix Brasil, abre hoje para convidados a festa da diversidade sexual que fica em cartaz em São Paulo até o dia 23 e depois segue para Belo Horizonte, onde acontece de 8 a 14 de dezembro.
O cardápio do festival dirige-se ao público que quer se enxergar retratado na tela. O fato de ser uma mostra sobre a diversidade sexual não quer dizer, porém, que todos os títulos programados sejam movidos por imagens de sexo, apesar de parte da programação abrigar produções picantes. Neste quesito, a maior atração é a releitura pornô de "O Segredo de Brokeback Mountain" protagonizada pela transexual Buck Angel, uma ex-modelo de ar angelical dos anos 80 hoje com aparência de garanhão musculoso, tatuado e com cara de mau.
Mas é na amplitude do conceito de sexualidade que o Mix Brasil mantém sua singularidade no calendário cultural. O que abarca a política, por exemplo, representada neste ano na produtiva filmografia israelense, que estará abrigada no 6º Ciclo Multicultural promovido pelo Centro de Cultura Judaica entre os dias 19 e 23. Em títulos como "Em Busca do Prepúcio Perdido", "Caminhando sobre a Água" e "Fucking Different Tel Aviv", questões como a identidade religiosa se misturam ao projeto de construções de gênero que permeiam as ficções e documentários gays.
Nem só de temática homossexual sobrevivem os filmes, sobretudo os de ficção. A busca de uma expressividade, por exemplo, pode ser vista em dois dramas selecionados. "Solos", produção de Cingapura, é feita por dois jovens diretores que se arriscam no terreno da dramaturgia sem palavras e bebem na fonte asiática de diretores como Tsai Ming-liang, com sua contemplação do vazio.
Formalmente mais inquieta é também a experiência do espanhol Sergio Candel em "Dos Miradas", filme de realização aberta, feito como uma aventura do diretor com duas atrizes e equipe minúscula. No cenário desértico do Atacama, uma crise emocional reflete os contornos dos espaços únicos, de que o cineasta estreante consegue se apropriar sem cair na armadilha do cartão-postal.

Zumbis gays
Provocação é o mínimo que se espera de Bruce LaBruce, diretor de ultrajes como "No Skin off My Ass", que mantém a coerência de seu percurso "queer" e visita o gênero filme de zumbi em "Otto; ou Viva a Gente Morta". Refúgio recorrente da parábola política, os zumbis de LaBruce servem de metáfora morta-viva à homossexualidade e aos medos residuais que cercam sua receptividade.
Da memória do antes e depois da Aids alimentam-se três documentários. Não enfocam a epidemia, mas sim artistas cujas trajetórias foram interrompidas pela morte precoce.
O mais aguardado é "Derek", que parte de uma carta da atriz Tilda Swinton para revisitar a obra do cultuado cineasta britânico Derek Jarman. "O Universo de Keith Haring" reconstrói com detalhes o percurso do artista que rompeu o muro que isolava o esnobismo das galerias da democracia urbana.
Menos conhecido é Arthur Russell, músico de vanguarda cuja trajetória, retratada em "Combinação Selvagem", coincide com a da atitude libertária que cruzou os EUA desde fins dos anos 60 ao advento da era Reagan, na década de 80, que marcou o retorno do neoconservadorismo ainda vigente.


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