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ERUDITO/CRÍTICA
Gil Jardim recria concerto dedicado a Villa-Lobos na Paris de 1924
IRINEU FRANCO PERPETUO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Finalmente chega ao CD
aquela que talvez seja a mais
representativa obra de câmera de
Villa-Lobos. O "Nonetto" é o
grande destaque de "Villa-Lobos
em Paris Pensées d'Enfant", álbum no qual o maestro Gil Jardim
recria o concerto inteiramente dedicado ao compositor brasileiro
que teve lugar na capital francesa,
em 30 de maio de 1924.
Subvencionado por mecenas do
Rio e de São Paulo, Villa-Lobos
parte para a França em 30 de junho de 1923, e tem sua música divulgada, entre outros, por um dos
maiores pianistas da época, Arthur Rubinstein (1887-1983), e pela cantora Vera Janacópulos
(1896-1955). Gerard Béhague assinala que a reação do público no
concerto de 1924 foi mista; contudo, a crítica reagiu bem, como
mostra a resenha de época reproduzida no CD, em que o articulista de "La Revue Musicale" que esteve presente à apresentação louva "o talento e a faculdade de invenção" do compositor, impressionando-se com "tamanha impetuosidade, tamanho poder, tamanha abundância".
Esse Villa-Lobos que chega à
Europa, logo depois da Semana
de 22, tem em sua sintaxe musical
uma retórica inegavelmente "modernista", presumivelmente influenciada pela "selvageria" da
"Sagração da Primavera", que o
russo Igor Stravinski (1882-1971),
não por acaso, fizera estrear em
Paris.
É tempo de valorizar "exotismos", e Villa-Lobos pesquisa formações instrumentais inusitadas,
como no etéreo "Quatuor", ou
"Quarteto Simbólico", que abre o
disco -uma encantadora combinação entre flauta, saxofone alto,
harpa e celesta, à qual se junta, no
segundo movimento, o coro feminino, com uma atmosfera onírica que recorda os noturnos de
Claude Debussy (1862-1918).
Segue-se o item mais conhecido
-a "Prole do Bebê nš 1", na qual
o pianista Nahim Marun tem a difícil tarefa de enfrentar a competição de gravações de astros consagrados, como Arthur Rubinstein
e Nelson Freire. E o faz com a
mesma elegância desempenhada
para acompanhar a soprano
Cláudia Riccitelli nos breves e experimentais "Epigramas Irônicos
e Sentimentais", sobre texto de
Ronald de Carvalho, bem como
no "lied" de três personagens
(uma espécie de "Erlkönig" tropical) "Pensées d'Enfant".
Mas o grande destaque é o "Nonetto", ou "Impressão Rápida de
Todo o Brasil", que vinha circulando em LP, mas ainda não merecera gravação digital. Flauta,
oboé, clarinete, fagote, saxofone,
harpa, celesta, piano e três percussionistas se unem ao coro misto
em uma obra telúrica, com efeitos
antecipando algumas das peças
mais interessantes do compositor
na série dos "Choros" (como os
"Choros nš 3" e os "Choros nš
10") e, simultaneamente, ecoando
o caleidoscópio bailado "L'Homme et son Désir", no qual o compositor francês Darius Milhaud
(1892-1974), que morou no Brasil
durante a Primeira Guerra, faz
um painel da vida nos trópicos,
incluindo citação do tema folclórico "O Meu Boi Morreu".
No melhor espírito de sua frase
"o folclore sou eu", Villa-Lobos,
no "Nonetto", cria um clima afro-brasileiro imaginário, colocando
o coro a entoar palavras inventadas, como "zango", "zizambango" e "dangozangorangotango".
No aspecto sonoro, o disco é
impecável, enquanto, no artístico,
Gil Jardim comanda um time de
bom valor, com nomes como Toninho Carrasqueira (flauta), Sergio Burgani (clarinete), Paulo
Braga (piano) e Eduardo Gianesella (percussão), entre outros.
Villa-Lobos em Paris Pensées
d'Enfant
Direção musical e regência: Gil Jardim
Produção: Philharmonia Brasileira
Onde encontrar: Livraria Cultura
Shopping Villa-Lobos (av. Nações
Unidas, 4.777, tel. 0/xx/11/3024-3599)
Quanto: R$ 41,85
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