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RÉPLICA
Quem tem medo de masturbação masculina?
JOSÉ CELSO MARTINEZ CORRÊA
ESPECIAL PARA A FOLHA
Na matéria "Autran não
perdoa ninguém e agrada a
todos" (Ilustrada de 30/11), dentre as críticas aplaudidas feitas por
aquele que tem o "cargo" de Primeiro Ator do Brasil, uma delas se
refere mais à minha pessoa. Pois
é, o detentor deste "cargo" está ao
lado de Costa e Silva*, Bush e Bento 16 na cruzada que declararam
contra as conquistas de liberdade
do amor libido.
Na guerra e massacres que as
castas do capital, balançadas pelas
conquistas da multidão, vêm fazendo, há um neofascismo todo
dedicado ao massacre de Eros,
tanto que nós todos hoje temos
que fazer a defesa política do
amor, como fazemos contra o racismo. No teatro esta guerra é a de
clones de atores contra Dionísios.
Por exemplo: comentando meu
trabalho atual que é "Os Sertões"
-cinco espetáculos de duração
de 30 horas-, o subsir caipira colonial Paulo 1º (que não nos deu a
honra de tê-lo no Oficina vendo a
cena ), partindo de fofocas, foca
no tabu da masturbação, no tempo da duração fugaz de um gozo,
uns três minutos numa peça de
seis horas: "A Luta 2". Mariano
Matos, grande jovem ator, cria
uma obra de arte de atuação com
a personagem do seu soldado
acordando no meio de um sonho
de amor, atacado pelos jagunços e
atingido no momento de sua "petite mort", o gozo.
A divina masturbação para Jean
Genet, para nós, é totem. Está na
base de todo trabalho do subtexto
livre e soberano do ator de gênio,
que sabe provocar sua imaginação a partir dos seus prazeres, sonhos e desejos mais viscerais e livres. Quem sabe praticar a oração
meditação, a masturbação, começa a se conhecer, saber de seu desejo, sabe dar espírito, alma ao seu
Eros, fazer passar por seu corpo o
corpo das personagens e dar-lhe o
mais precioso, seu tesão elétrico,
para que a personagem seja dada
sensual, táctil, teatral, livre e viva
para o público. Coisa que este cabação nunca experimentou, e por
isso nos aborreceu sempre (exceto na TV e no cinema) com uma
série de interpretações insípidas
de salão de tias, e talvez por isso
mesmo tenha sido consagrado.
Além dos lugares-comuns da
mais escrota classe média de suas
posições sobre o governo, sobre
nós, os diretores de teatro etc.,
mais que sua burrice, me escandalizou o choque, pela revelação,
junto com Barbara Heliodora,
(ela tem a mesma posição sobre a
masturbação e o teatro), do Primeiro Ator do Brasil estar aliado
aos ataques mais asquerosos ao
amor libido no mundo. Meus pêsames.
(*Costa e Silva, ditador de óculos escuros em 68, que declarou
na TV que "Santidade", de Zé Vicente, jamais seria representada
no Brasil; desde este tempo Paulo
Autran já era tronado como "primeiro-damo", tendo feito antes
"Liberdade! Liberdade!")
José Celso Martinez Corrêa é diretor de teatro
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