São Paulo, sábado, 13 de janeiro de 2007

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Livros

Jeremias, o Bom, volta em charges inéditas

Reedição de álbum de 1969 tem cartuns políticos que Ziraldo havia suprimido

Espécie de anti-Amigo da Onça, personagem nasceu no "Jornal do Brasil" e migrou para "O Cruzeiro", onde teve curta carreira política


EDUARDO SIMÕES
DA REPORTAGEM LOCAL

Jeremias, o carioca, está de mudança para São Paulo. O "Bom", personagem criado pelo cartunista Ziraldo, 74, nos anos 60, vai batizar um bar no bairro da Bela Vista, onde, no dia 20 de janeiro, próximo sábado, acontece o relançamento de um álbum de 1969. O livro compilava charges de Jeremias, publicadas, naquele seu último ano de existência como personagem semanal, pela revista "O Cruzeiro".
A reedição, da editora Melhoramentos, vem com mais páginas do que o original, por conta de mais de dez cartuns inéditos em livro, que Ziraldo na época achou melhor deixar de fora, por conta de seu conteúdo político.
"Sempre que um personagem meu acabava, eu publicava algumas de suas histórias em livro, para eternizá-lo. Não houve censura prévia por parte dos editores para o álbum do Jeremias. Mas meu temor era colocar aquelas piadas políticas e os livros acabarem sendo apreendidos pela polícia. Aí não teria sentido", diz Ziraldo à Folha.
O temor do cartunista não era em vão. Cerca de um ano antes da publicação do álbum "Jeremias, o Bom", pela Expressão e Cultura, Ziraldo participou de uma coletânea da mesma editora, chamada "Dez em Humor", que tinha ainda Millôr Fernandes, Jaguar e Henfil, entre outros. O lançamento aconteceu no Rio de Janeiro, no dia 13 de dezembro de 1968, quando foi editado o AI-5. "No dia seguinte eu fui preso em casa", conta o cartunista, então levado para o Forte de Copacabana, considerado "elemento perigoso".

Nasce um estilo
Jeremias, o Bom, surgiu nas páginas do "Jornal do Brasil", onde foi publicado entre 1965 e 1969, quando migrou para "O Cruzeiro". Ziraldo já assinava uma página dominical de cartuns no jornal, abordando temas diversos do Brasil, mas achava que não tinha tanta repercussão. "Faltava um personagem. Como o Amigo da Onça, que era um malandro, fazia sucesso, resolvi criar um anti-Amigo da Onça", conta Ziraldo, referindo-se à criação de Péricles Maranhão (1924-1961), celebrizada nas páginas daquela mesma revista.
Inicialmente um personagem voltado para a crítica de costumes, Jeremias "aderiu" à política durante as cerca de 20 semanas em que foi publicado, segundo Ziraldo, sem que os editores de "O Cruzeiro" notassem as críticas ao regime militar. A militância de Jeremias acabou causando a demissão do cartunista da revista.
O personagem, diz Ziraldo, inaugurou um estilo que ele voltou a utilizar em outras criações, como a Supermãe e o Menino Maluquinho. Depois de anos desenhando "A Turma do Pererê", o cartunista queria se livrar do que chama de "condicionamento" de seus personagens de histórias em quadrinhos, e criar uma "anatomia menos convencional".
"O traço do Jeremias era mais moderno, com aqueles pés de ferro elétrico, como dizia o Borjalo", conta Ziraldo. Espécie de Dom Quixote, como compara Ziraldo em texto de apresentação da nova edição do álbum, Jeremias era flamenguista roxo, aceitava ficar de fora de uma pelada, mesmo sendo o dono da bola, e, dizem, era tão bom, tão bom, que nem causou dor a sua mãe ao nascer. Além desse lado "comportamental", de crítica de costumes, como coloca Ziraldo, o livro apresenta Jeremias em sua curta fase política, quando aparece num festival de música, aplaudindo um cantor parecido com Geraldo Vandré, autor do quase hino "Pra Não Dizer que Não Falei de Flores". E ainda participando de passeata estudantil ou ajudando agricultores nordestinos a assistirem a uma missa clandestina do ex-arcebispo de Pernambuco Dom Hélder Câmara, o "bispo vermelho", como era conhecido.


JEREMIAS, O BOM
Autor:
Ziraldo
Editora: Melhoramentos
Quanto: R$ 39 (144 págs.)
Lançamento: dia 20, a partir das 12h (Jeremias, o Bar, r. Avanhandava, 37, Bela Vista, s/tel.)


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