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Crítica/coletânea
Antiamericanismo dá o tom em entrevistas baseadas em Paris
OSCAR PILAGALLO
ESPECIAL PARA A FOLHA
"Entre Aspas", que
reúne 27 entrevistas feitas por Fernando Eichenberg para revistas e jornais brasileiros, inclusive a Folha, pode ser um painel
da cultura contemporânea, como observa Moacyr Scliar na
apresentação. Mas não se trata
de um painel qualquer. É um
painel com viés antiamericano,
o que talvez seja natural, dado
que o jornalista, baseado em
Paris, conversa sobretudo com
artistas e intelectuais formados
na tradição francesa.
Os pensadores Jean Baudrillard, Tzvetan Todorov e Paul
Virilio dão o tom ao denunciar
a política dos EUA. Jean Baudrillard, ao comentar a atitude
dos americanos após o 11 de Setembro, afirma que os valores
universais foram aniquilados.
"Valores como a democracia ou
direitos humanos são instrumentalizados a serviço da própria superpotência, que age em
contraponto ou mesmo em
contradição com seus próprios
valores."
Todorov, búlgaro por nascimento e francês por adoção, toca igualmente a tecla das ameaças provenientes do interior da
democracia. Para ele, o perigo
não são mais os inimigos externos, como o totalitarismo, mas
a "doutrina do direito de ingerência que apareceu nestes últimos anos como uma nova
conquista, como algo que a democracia teria obrigação de
praticar". Para Virilio, a guerra
contra a Iugoslávia alterou o
conceito de guerra justa.
O cinema americano também não escapa das críticas.
Jean-Luc Godard reclama de
Hollywood. "Podemos ver
maus filmes norte-americanos,
mas não podemos ver um mau
filme brasileiro", diz o cineasta,
que não acompanhou o cinema
brasileiro após Glauber Rocha.
O antiamericanismo, que
permeia algumas entrevistas,
não chega a ser um elemento
dominante do livro. Este, se
existe, é a diversidade. Há espaço até para encômios a aspectos da cultura dos EUA. Henri
Salvador, compositor de "Dans
Mon Île", que Caetano Veloso
gravou nos anos 80, se derrama
em elogios a Nat King Cole,
"que cantava na respiração", e
Frank Sinatra, "que sabia muito bem cantar falando".
O cantor, nascido na Guiana
Francesa, conta a história, atribuída a Sérgio Mendes, de que
teria sido inspirador da bossa
nova. Tom Jobim teria ouvido
"Dans Mon Île" e dito: "Isso
que é preciso fazer, reduzir o
tempo do samba e criar algo
novo". O episódio -não mencionado em "Chega de Saudade", embora Ruy Castro dê crédito à influência da música- é
uma mostra das pérolas encontradas em "Entre Aspas".
OSCAR PILAGALLO é jornalista e autor de "A
História do Brasil no Século 20" (em cinco volumes, pela Publifolha).
ENTRE ASPAS
Autor: Fernando Eichenberg
Editora: Globo
Quanto: R$ 40 (464 págs.)
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