São Paulo, domingo, 13 de janeiro de 2008

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Jornalista é BBB durante meia hora

Convidados pela TV Globo, cinco repórteres acompanham dentro da casa os primeiros momentos do reality show

Não é permitido entrar com caneta ou papel; sem saber da presença de jornalistas, participante pensa que eles estão ali para promover festa

Divulgação/ TV Globo
Integrantes do programa, ao lado de bufê de canapés, no primeiro
encontro com os repórteres


PAULO SAMPAIO
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma reportagem sem caneta, bloco de anotações, gravador ou máquina de fotografar. Como no café da manhã de fim de ano oferecido à imprensa pelo presidente Lula, no Palácio da Alvorada, os jornalistas convidados a visitar na terça-feira passada a locação do programa "Big Brother Brasil", da TV Globo, não puderam anotar nem gravar nada.
A assessoria da emissora avisa aos cinco convidados que eles têm vinte minutos para "sentir o ambiente na casa". "É como se vocês fossem "big brother'!", diz a assessora, lançando um alegre desafio.
"Que mico", murmura uma colega repórter, pouco antes da incursão. Ela se refere também à obrigatoriedade de assinar um termo de compromisso de cessão de imagem para TV.
"Imagina, ninguém vai lembrar de colocar imagens da gente", diz outra colega, para tranqüilizar a primeira. (Todo mundo apareceu no vídeo).
Apesar do "mico", os jornalistas são recebidos no Projac, o megaestúdio carioca da emissora, como um grupo de "privilegiados" (pela oportunidade de estar ali). A assessoria quer fazer crer que os cinco, representantes dos maiores veículos de imprensa escrita do país, foram sorteados. Depois, por telefone, reconhece que a escolha foi de caso pensado.

Qualquer pessoa pode
Na porta da casa, os repórteres conversam com o diretor de núcleo, Boninho, o apresentador Pedro Bial e o diretor geral, LP Simonetti. As perguntas são do tipo: "Teve marmelada na escolha dos participantes?".
"Não existe a menor possibilidade. Se alguém tenta indicar um amigo pra mim, esse candidato está automaticamente desclassificado", responde Boninho. Para provar que qualquer pessoa pode participar do programa e que não se buscam personagens estereotipados, Boninho diz: "Não há nenhuma negra, por exemplo".
Mas há um negro, lembra um repórter. Tem cota? "O rapaz (negro) tentou pela terceira vez. Agora, ele estava pronto", explica o diretor de núcleo.
Os jornalistas entram na casa. Depois de bisbilhotar livros, murais e checar a decoração, eles voltam para o pátio central. Não viram ainda os BBBs, apesar de eles estarem lá dentro (trancados no confessionário): a liberação só se dá quando os repórteres já estão no pátio.
Pronto! Os 14 irrompem pela porta automática, aos gritos, meio embolados, como se estivesse pegando fogo lá dentro.
Em um descontrolado desbunde nervoso, os participantes falam ao mesmo tempo, perguntam se podem beber a cerveja disponível no bufê, riem muito alto, se empurram, gralham e, apesar de terem acabado de se conhecer, já demonstram uma incrível disposição para a intimidade.
São extremamente "facinhos": conversam com os jornalistas durante cerca de 15 minutos, sem questionar nada. "Quem vocês acham que nós somos?", pergunta um repórter. "Ahhhh, vocês devem ser as pessoas que vão preparar uma festa pra gente...", dizem, alegremente.
Um repórter apresenta os jornalistas e diz o veículo de cada um: "Nossa, só tem os "crânio'", observa Marcos, 25, vestindo apenas um bermudão com o cós abaixo da linha dos pêlos pubianos.

A verdadeira cachorra
A primeira "sensação" marcante, e que dispensa caneta ou bloco para posterior lembrança, é a devastadora presença de borrachudos. A segunda, que só faz agravar a primeira, é a irrefreável catarse dos "brothers".
Daniela Mercury entra: "A cor dessa cidade sou eeeeeeeu!"
Começa uma acirrada competição de rebolado. Depois de entortar a coluna vertebral até o limite do improvável, Jaqueline, 23, diz: "Comprei biquínis maiores para usar aqui, porque não quero me expor muito."
"Essa mente", afirma Boninho mais tarde, na continuação da conversa com a imprensa. Segundo o especialista, a "verdadeira cachorra" se entrega justamente numa declaração exageradamente puritana.
Boninho diz ainda que um dos candidatos revelou a ele que é gay. O psiquiatra Marcelo, principal suspeito, parece confuso. "Cara, eu não digo que sou isso ou sou aquilo, mas acho que, se alguma coisa estiver para ser revelada aqui, sem problemas". O psiquiatra explica ainda que está ali "não como médico, mas como pessoa."
A bartender Thalita, 29, afirma que desde os 16 anos é atriz, como a mãe, Nadia Lippi. Mas não sabe se "dá para a coisa". "Eu não aconteci até agora. Vai ver que eu não tenho talento."
A modelo Juliana diz que sua estratégia é "ser eu mesma".
O gerente de contas Fernando, 25, afirma que não toma mais "bomba". "Tinha 42cm de bíceps, agora estou com 40cm."
Nesse contexto, descobrir se uma das participantes é lésbica parece um furo de reportagem. Mas Bianca, 28, a mais cotada, ri da possibilidade. "Gente, isso é muito engraçado!"
Os meninos olham para o "campeonato de rebolado" como se estivessem em frente a uma fileira de franguinhos de padaria. De repente, uma produtora aparece e recolhe os jornalistas: "Tá na hora!", diz.
Os "privilegiados" ficaram até mais que os vinte minutos preestabelecidos: das 17h17 às 17h58. Nem precisava tanto.


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