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São Paulo, quinta-feira, 13 de março de 2003

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A atriz Esther Góes revisita a personagem que já viveu no cinema e no teatro nos anos 60

Tarsila [ao cubo]

VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

No centro do palco, no alto, um cubo envolto em tela branca recebe a projeção dos quadros de Tarsila do Amaral (1886-1973).
"É ali que se dá a presença da memória, do subconsciente. As projeções são deformadas, como manda o raciocínio cubista da desconstrução", afirma a artista plástica Maria Bonomi, de volta à cenografia.
Foi por meio do cubismo, descoberto na França, que Tarsila empreendeu outras leituras para o Brasil, um tema dileto.
No espetáculo "Tarsila", a personagem-título é representada ao lado de Oswald de Andrade, Mário de Andrade e Anita Malfati. Resta a quinta parte, Patrícia Galvão, a Pagu, apenas citada nos diálogos, para completar o eixo que instaurou novos paradigmas para as artes brasileiras a partir dos agitados anos 20.
As relações de afeto e hostilidade que guiaram esse grupo, sob o prisma da pintora e da mulher Tarsila, estão na peça de Maria Adelaide Amaral. A montagem estréia amanhã no teatro Sesc Anchieta, em São Paulo, com direção de Sérgio Ferrara.
"Não me senti intimidada pela importância histórica e artística [desses personagens" porque preferi abordá-los através de sua humana condição. Foram vitais as leituras da correspondência, as entrevistas com as pessoas que os conheceram pessoalmente", afirma Maria Adelaide, 60.
Entre as fontes, estão Tarsila do Amaral, a Tarsilinha, sobrinha-neta da pintora, e o artista Tuneu, que trabalhou com ela durante 15 anos. O arco da dramaturgia vai de 1922, quando acontece a Semana de Arte Moderna (da qual Tarsila não participa), até 1973, quando a pintora morre, aos 86 anos.
Apesar do recorte histórico, Ferrara, 35, deseja extrair do texto a "ética da amizade", a cumplicidade desses artistas. O diretor espera que o público compartilhe essa intimidade evocada como se ouvisse uma história ao pé do ouvido. "Há uma sinceridade nos relacionamentos que não encontramos hoje, quando muitos artistas ficam em seus casulos, mais preocupados com o que o outro vai fazer com a verba que conseguiu", diz Ferrara.
A atriz Esther Góes parece completar mais um ciclo do seu eterno retorno com Tarsila. Ela estava lá, por exemplo, na montagem de "O Rei da Vela" (1967), de Oswald, pelo Oficina de Zé Celso; e no filme "Eternamente Pagu" (1967), de Norma Benguel, interpretando o papel da pintora. "Tarsila tinha uma fantástica alegria de viver que brilhava nos olhos. Ela era contida, por reflexão até, mas, quando agia, fazia questão de colocar os pingos nos is", diz Esther.
Como Oswald (José Rubens Chachá), Mário (Luciano Chirolli) e Anita (Agnes Zuliani), sua personagem foi concebida "com os pés no chão, não na mitologia", afirma a atriz protagonista.
"As obras deles já são eternas. Optamos pelo enfoque humanista", completa Ferrara.
São pontuais, por exemplo, o casamento de Tarsila com Oswald (1926-29). A ruptura, "sem nenhum grito", observa Ferrara, acontece quando ela descobre que ele a traia com Pagu.
Outros dois momentos de tragédia surgem na separação de Luis Martins, 21 anos mais novo, e nas mortes da neta e da filha. E Tarsila pincela a tudo e a todos com a dor e a alegria de se viver.


TARSILA - De: Maria Adelaide Amaral. Direção: Sérgio Ferrara. Com: Esther Góes, José Rubens Chachá, Luciano Chirolli e Agnes Zuliani. Onde: teatro Sesc Anchieta (r. Dr. Vila Nova, 245, Vila Buarque, tel. 0/xx/11/3256-2281). Quando: estréia amanhã, às 21h; qui. a sáb., às 21h; dom., às 19h. Quanto: R$ 30. Até 25/5. Patrocínio: Vega e Grupo Santander Banespa.


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