São Paulo, segunda-feira, 13 de março de 2006 |
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A desconstrução de Guantánamo
SILVANA ARANTES DA REPORTAGEM LOCAL O cerco se fecha sobre Guantánamo. No mês passado, a ONU (Organização das Nações Unidas) pediu aos EUA que desativem sua prisão de segurança máxima na base cubana, onde pelo menos 760 homens já foram presos, por suposto elo com o terrorismo. O pedido da comunidade internacional se fundamenta na suspeita de que o Exército norte-americano use ali práticas que violam os direitos humanos, impondo torturas aos prisioneiros, além de detenções arbitrárias. Na semana passada, o Departamento de Defesa dos EUA teve de tornar públicas mais de 5.000 páginas de registros dos interrogatórios feitos em Guantánamo. A divulgação dos documentos obedeceu a uma exigência da agência de notícias Associated Press, que invocou a Primeira Emenda da Constituição dos Estados Unidos (sobre a liberdade de expressão e de imprensa), para ter acesso às informações. Viagens Agora chegou a vez de o cinema voltar sua atenção para um dos assuntos que mobilizam o noticiário internacional depois dos ataques do 11 de Setembro. Os cineastas suecos Erik Gandini e Tarik Saleh acabam de concluir o documentário "Gitmo -The New Rules of War" [as novas regras da guerra; "gitmo" é a forma abreviada, em inglês, para Guantánamo], que filmaram durante dois anos. Nesse tempo, os cineastas foram diversas vezes à base militar, onde fizeram imagens e entrevistas. Mas ouviram poucos relatos reveladores do cotidiano intramuros. Foi longe de Guantánamo, num extremo do litoral dos EUA, que a dupla encontrou Janis Karpinski, oficial que conheceu Guantánamo por dentro, antes de ir para a prisão iraquiana de Abu Ghraib, como superior hierárquica dos soldados que documentaram em fotos suas sessões de tortura aos prisioneiros. Com a ajuda de Karpinski, Gandini e Saleh apresentam Guantánamo como um trailer de Abu Ghraib. "Gitmo" será exibido neste mês no Brasil, na disputa do Festival É Tudo Verdade [leia texto à dir.]. Gandini e Saleh são veteranos na mostra. Em 2001, venceram com "Sacrifício - Quem Traiu Che Guevara?", no qual desafiam a tese de que foi o artista plástico argentino Ciro Bustos quem delatou Guevara na Bolívia, em 1967, onde o líder argentino foi morto. Em "Gitmo", os cineastas retomam características de "Sacrifício": tom interpelativo com certos entrevistados, a exposição de suas frustradas tentativas de obter informações e uma trilha sonora inusual em documentários. Para Gandini, trata-se de filmar "documentários com um ponto de vista", escola em que o líder seria o norte-americano Michael Moore ("Fahrenheit - 11 de Setembro"). "Ninguém mais questiona que um documentário é feito não para ser objetivo, mas para permitir que um diretor diga algo que considera relevante. Num mundo em que a maioria dos conteúdos é produzida por instituições, os documentários se erguem como vozes livres e independentes, e Michael Moore mostrou a magnitude disso", diz. Segundo o diretor, mais do que acrescentar peças ao quebra-cabeças de Guantánamo, "Gitmo" quer ajudar a compreender a figura (difusa) já desenhada. "Em relação a Guantánamo, o que interessa não é o que não se sabe, mas o que já se sabe, porém cuja essência não se compreende", afirma, em entrevista à Folha. Leia mais trechos a seguir: Folha - Que aspectos de Guantánamo mais o surpreenderam? Folha - O depoimento de Janis
Karpinski, superior hierárquica dos
soldados que praticaram tortura
em Abu Ghraib, é o grande trunfo
do filme. Mas ela diz que se sente
traída pelo Exército. O sr. temeu a
possibilidade de seu filme ser usado como instrumento de vingança? Folha - Seu filme é crítico à mídia,
embora o sr. utilize procedimentos
do jornalismo investigativo. Qual é
a sua opinião sobre a imprensa? |
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