São Paulo, sexta-feira, 13 de março de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Réplica/teatro

Texto sobre DVDs do Oficina não reparou que vivemos numa era "cyber"

JOSÉ CELSO MARTINEZ CORRÊA
ESPECIAL PARA A FOLHA

N ão sei se foi o editor da Ilustrada ou o crítico que deu o título do texto sobre o lançamento dos DVDs do OficinaUzynaUzona como "Registro". Não importa.
Os espetáculos remontados foram gravados caleidescopicamente por muitas câmeras, e no Avid, mesa de montagem, ganharam autonomia da linguagem dessa mídia, desprenderam-se do teatro e transformaram-se num objeto-sujeito novo no universo audiovisual, como manifestaram-se em debate os espectadores de uma exibição feita em tela de cinema em um festival em Paris.
Essa especificidade reducionista limita a qualidade de obras de arte desses DVDs. O novo, como em "Roda Viva", quando o espetáculo passava-se na plateia e os fotógrafos da época ainda fotografavam somente o palco, dificilmente é percebido sem olhos novos. São obras validadas por si; ao contrário de sofrerem a limitação de "congelar o que é por natureza efêmero", eternizam e libertam obras de atores artistas antes condenados a terem seu trabalho "imortalizado" nos vídeos, mas interpretados pelo marketing moralista e maniqueísta das novelas de TV.
O crítico da Folha não teve ainda a percepção para captar que vivemos numa era cyber, por isso talvez tenha um aparelho de DVD de baixa qualidade, incapaz de reproduzir a LUZ deslumbrante de Carlos Alberto Ebert para "Ham-let", e por isso talvez tenha confundido a bela fotografia com escuridão, confusão em que certamente não cairão os críticos de cinema, assim como não deixarão passar despercebida a beleza de Marcelo Drummond, de suas atuações nos quatro DVDs, em que, além de Hamlet, interpreta Dionisio, Boca de Ouro e Walmor Chagas.
Luiz Fernando Ramos dedica parágrafo inteiro para bodificar Marcelo inspirado num ressentimento de caráter pessoal, por um lado, e, por outro, levado por seu espírito de rebanho, fazendo coro com os "hate groups" decretadores cinquentenários do fim do Teatro Oficina e de tentativas fracassadas de assassinarem os Bodes Cantores do Oficina.

"Universotário"
Depois disso vem a história de "espetáculos intermináveis que costumam dificultar a recepção do público". "Ham-let" e todas as peças que inspiraram essa nova obra foram sucessos imensos de público e de crítica; todas, à exceção de "Boca de Ouro", premiadas. Aí vem o lado "universotário", criando o estigma no nosso trabalho de "pedagogia do êxtase".
Nietzsche explodiu a filosofia metafísica porque trouxe a percepção da alegria na tragédia, retornou ao pagão e deixou seu legado enorme para nossa época. Nos deu coragem para não sermos niilistas, positivistas tristes. Nestes anos de "change" do império nossa alegria é vista como uma "militância" por todos os Pentheus, inclusive por esse que escreve a crítica.
Não podem admitir os antropófagos gozadores da vida, na dor, na felicidade, no amor mortal misturado com o imortal que aprendemos com a mãe de Dionísio, Semelle, que nas "Bacantes" inaugura a cópula da mortal com a imortal e introduz, na morte, vida, transformação: a eternidade do amor bacante.

JOSÉ CELSO MARTINEZ CORRÊA é diretor de teatro.


Texto Anterior: Crítica: Conto de Móricz se desdobra em drama irregular
Próximo Texto: Ramos fez ressalvas a "Ham-let"
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.