São Paulo, sexta-feira, 13 de março de 2009

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Crítica

Conto de Móricz se desdobra em drama irregular

"A Mulher que Ri" é exemplo de como o formato do conto se molda à cena contemporânea. A fonte do espetáculo é o conto "Sete Moedas", publicado em 1907 pelo escritor húngaro Zsigmond Móricz (1870-1942). Ele relata o dia em que a mãe do narrador, precisando comprar sabão, passa a procurar por moedas em todos os cantos da casa. No espetáculo, a história é pretexto para o delineamento dos personagens e ponto de chegada na curva dramática em que se enredam.
A mãe é a mulher que ri, não porque seja alegre demais, nem porque não tenha motivos para ser triste, mas porque rir é sua marca. A atriz Eloísa Elena está segura na composição da personagem, sustentando com firmeza a frágil consistência de sua condição arquetípica, mais afeita à literatura. O pai criado por Plínio Soares, ausente do conto original, é sombrio e enérgico ao mesmo tempo. O ator serve-se da maturidade e de inteligência poética para encarná-lo.
O filho construído por Fernando Alves Pinto é o personagem menos à vontade em cena. Como o próprio narrador, ele prende a atenção dos espectadores. Já quando dialoga com os demais personagens, deixa-se dispersar em psicologismos.

Altos e baixos
Parte da responsabilidade por esses altos e baixos reside na dramaturgia de Paulo Santoro. A opção de fragmentar o fio narrativo não resulta numa trama efetiva. Mesmo admitindo que a intenção seja mesmo essa, algo permanece frouxo a ponto de enfraquecer-se a fruição. Já a alternativa de situar um escritor recordando sua infância -os embates pela emancipação com o pai e as dificuldades de se emancipar da mãe- é oportuna e, aproveitando-se do conto de Móricz, atende a vocação social de sua literatura, preocupada em revelar a realidade de populações humilhadas. A história que se ensaia e se retoma, na consciência do filho, também torna a montagem das cenas um jogo interessante. A reforçá-lo, a caixa transparente criada pelo cenógrafo André Cortez, servindo tanto como espaço da casa como da memória.
A direção de Yara de Novaes contribui para tornar o espetáculo uma experiência teatral relevante. Cenas como a do telefone de lata, ou a do fado cantado em sóbria alucinação, projetam um talento e uma vocação para a escritura de cenas. Por outro lado, parte da lassidão dramática e o esgotamento precoce das expectativas do espectador devem ser tributados a certo descontrole sobre o ritmo e a conexão das cenas. O que parece natural quando um conto se desdobra em drama.


A MULHER QUE RI
Quando: sábado, 21h, e domingo, às 20h. Até 31/05
Onde: Teatro Alfa (r. Bento Branco de Andrade Filho, 722, tel.: 5693-4000)
Quanto: de R$ 20 a R$ 40
Classificação indicativa: não recomendado a menores de 14 anos
Avaliação: regular



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