|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
IMAGEM
Fotografias de Rogério Assis tiradas quando passou três meses na ilha são expostas em galeria em Berlim
Mostra traz Cuba que Cuba não quer ver
FERNANDO OLIVA
da Redação
O grande mérito das imagens feitas pelo fotógrafo brasileiro Rogério Assis em Cuba é registrar o doloroso ponto de inflexão na história recente da ilha, o momento em
que se consumava, no dia-a-dia da
cidade, o fim da ajuda financeira
vinda da ex-União Soviética.
Registro em preto-e-branco da
decadência do país e do desespero
de seu povo, parte dessas fotos (21,
dentre as quase 1.500 que ele bateu) chega agora a Berlim, depois
de correr o mundo distribuída pela
agência paulistana Angular -publicada, entre outras, pela revista
italiana "Sette" (suplemento dominical do "Corriere de la Sierra"),
a francesa "Reporter" e a "Interview" espanhola, além de "Veja".
Assis, que hoje é fotógrafo free-lancer em Nova York, morou em
Cuba durante três meses em meados de 1992 para compor a série.
Época em que cada pessoa tinha
direito a comprar, por mês, 2,5 kg
de arroz, meio quilo de feijão, cerca de 250 gramas de café mesclado
e meio sabonete. Na época com 27
anos, ele não entrou em Cuba se
apresentando como fotojornalista.
Alertado por colegas de profissão,
disse que era estudante.
Sua coragem valeu a pena. Assis
conseguiu, por exemplo, uma das
primeiras imagens de uma favela
cubana a ser divulgada em larga
escala pela imprensa.
São, claramente, retratos "roubados", de atividades e situações
que não correspondem exatamente à imagem de sucesso e bem-estar que o regime castrista gostaria
de passar ao mundo.
Como a florescência, com o agravamento da crise econômica, do
transporte feito por charretes. Ou
a prostituição, prática proibida,
em plena rua de Havana.
Ou ainda a foto de um cubano
que monta, a céu aberto, um mercado negro de hambúrgueres -à
época, se descoberto por um dos
CDRs (Comitês de Defesa da Revolução) que atuam em Cuba, o vendedor poderia ser acusado de "inimigo da revolução", considerado
ainda o maior crime no país.
Mas nem os CDRs nem a polícia
da ilha impediu Assis de fazer o seu
trabalho. "A não ser dos abrigos
antiaéreos construídos por Fidel
na ilha, espécies de trincheiras
enormes próximas a Havana."
Hospedado em casa de cubanos,
circulando de bicicleta, ele fotografou, além de Havana, as províncias de Santa Clata, Pinar del Rio,
Matanzas, Trinidad e Sienfuegos.
A série, que já foi exposta em São
Paulo em 1994, foi recebida na Alemanha em local inusitado: um ex-armazém da colônia judaica que,
abandonado desde 1909, foi invadido por artistas em 1990 e transformado em galeria de arte. Batizado Tacheles, o espaço ainda se conserva parcialmente em ruínas.
A curadoria da mostra é da brasileira Sônia Frye, que reside em
Berlim há mais de dez anos. Ela
também é idealizadora do projeto
Amate (tel. 00-49-30-859-2044),
espécie de galeria itinerante criada
em 1994 e que já expôs trabalhos
do fotógrafo Sebastião Salgado e
do artista plástico José Rufino.
Exposição: Cuba, por Rogério Assis (21
imagens em preto-e-branco, 30 cm x 40 cm)
Quando: qua a dom, 12h às 22h. Até 17/4
Onde: galeria Tacheles (Oranienburger
Strasse, 54-56, tel. 00-49-30-282-6185,
Berlim)
Na Internet: www.tacheles.de
Texto Anterior: Duchamp é a grande atração da cidade Próximo Texto: Cinema: Festival exibe 5 filmes de Walter Salles Índice
|