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Brasil adere à economia da cultura
A administração da cultura no país ainda segue os modelos erguidos por Gustavo Capanema e Mário de Andrade
Ao contrário de França, EUA e Inglaterra, país não definiu prioridades para a cultura e tenta estabelecer limites entre Estado e mercado
DA REPORTAGEM LOCAL
Foi o escritor Pedro Nava
quem constatou: "Tudo começou com Capanema". Pode não
ter sido tudo. Mas foi quase.
Gustavo Capanema, ministro da Educação e Saúde Pública do governo Getúlio Vargas,
ergueu a sede do Ministério da
Educação, no Rio, com traçado
de Le Corbusier, criou o Serviço de Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional, o Instituto
Nacional do Livro e o Museu
Nacional de Belas Artes.
Villa-Lobos dedicou a ele a
"Bachiana nº 5". Drummond de
Andrade chefiou seu gabinete.
Mário de Andrade foi um de
seus auxiliares mais próximos.
Sem negar a validade da frase
de Nava, é importante dizer
que coube a Mário de Andrade,
em 1935, a criação do departamento de cultura do município
de São Paulo. Naquele momento, estabelecia-se que o Estado
tinha o dever de oferecer cultura ao cidadão e o poeta modernista tornava-se nosso primeiro administrador cultural.
Oito décadas passadas, Andrade e Capanema são, ainda,
as principais referências teóricas da política cultural brasileira. "Dentro de um conceito do
século 21, a gente tentou retomar a importância que a cultura teve nessa época para a formação da identidade brasileira", diz o ministro Juca Ferreira. "Hoje, sabemos que o Estado é incontornável. Se deixarmos a cultura nas mãos do mercado, o direito de acesso do povo não se realiza plenamente."
O dilema do mercado
Se com Capanema começa a
se desenhar a participação do
Estado na cultura e com Mário
de Andrade conceituou-se o
que é gestão pública, com as leis
de incentivo -fortalecidas nos
anos 1990 -o Brasil aderiu à
chamada economia da cultura.
Além da Lei Rouanet, uma
série de leis de incentivo criadas por Estados e municípios
injetaram, no setor, dinheiro de
imposto das empresas privadas
e estatais. "O artista ainda tende a esperar o paternalismo, o
dinheiro para suas produções",
diz Ney Piacentini, da Cooperativa Paulista de Teatro. "Houve
um descaso com o público."
Para Sharon Hess, que trabalha com captação de recursos e
fez mestrado em gestão de políticas públicas na Inglaterra, o
problema, no Brasil, é que se
discute o modelo, mas não a política. "O que se quer para a cultura? Essa resposta não está
clara", diz. "Para a educação, o
governo estabeleceu metas.
Por que não fazer isso com a
cultura? O que o país quer? Desenvolver políticas de acesso,
investir em cultura popular ou
em grandes eventos?"
A partir dessas perguntas se
estruturaram os três grandes
modelos do mundo: o francês, o
norte-americano e o inglês.
Na França, cabe quase tudo
ao Estado. Saíram dos cofres
públicos, em 2009, R$ 7 bilhões
destinados a produtores das
mais diversas áreas e perfis.
Nos EUA, existem grandes
fundações privadas e um mecanismo de renúncia fiscal que,
ao contrário do que acontece
no Brasil, prevê contrapartida
privada. Há, ainda, o dinheiro
estatal distribuído pelo National Endowments for the Arts,
uma agência federal que procura viabilizar o que, lá, é chamado de "excelência" nas artes.
Trata-se, porém, de um volume
restrito de dinheiro.
A Inglaterra, por sua vez, prevê R$ 5,3 bi anuais para a cultura, mas não é o Estado, como
acontece na França, que cuida
de sua distribuição. Existe um
órgão intermediário, o Arts
Council, formado por especialistas, que tem independência
para definir o destino das verbas -desde que cumpra as metas determinadas pelo governo.
(ANA PAULA SOUSA)
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