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PATRIMÔNIO
Equipe de arqueólogos encontrou no canteiro de obras vestígios do Forte do Matos, do século 17, no Recife Antigo
Ruínas são descobertas em construção de shopping
ISRAEL DO VALE
DA REPORTAGEM LOCAL
Uma equipe de arqueólogos
pernambucanos encerrou no último sábado a fase inicial de escavações para mapeamento de um dos marcos no processo de expansão que, a partir do século 17,
multiplicou por dez o tamanho do istmo de Olinda, antigo elo entre a cidade histórica e Recife Antigo. Os trabalhos resultaram na
identificação de ruínas da Fortaleza da Madre de Deus e São Pedro,
conhecida como Forte do Matos, última grande edificação do gênero na história de Pernambuco.
Construída entre 1684 e 1685 pelo mascate português Antônio
Fernandes de Matos, a fortificação teve papel vital como instrumento de defesa -não do território, mas dos interesses da casta
comerciante em formação.
O Forte do Matos foi erguido
sobre um banco de areia na região
portuária de Recife, que chegou a
abrigar o maior porto das Américas. A idéia foi apresentada ao governador da capitania, dom João
de Souza, sob argumento de que a
cidade era vulnerável na porção
setentrional. Matos bancou o empreendimento, negociando em
troca o título de capitão e toda terra que emergisse do assoreamento entre o forte e o continente.
Ganhou uma área de 37 mil m2,
estratégica na guerra de nervos
então travada entre senhores de
engenho e comerciantes, em defesa de dois modelos econômicos
distintos: de um lado, o cultivo da
cana-de-açúcar, em declínio; de
outro, a ampliação do comércio
portuário, que levaria à formação
de um extrato social crescentemente rico e a conflitos como a
Guerra dos Mascates.
Com 100 m de largura e 160 m
entre seus dois baluartes, o Forte
do Matos incluía dois quartéis na
entrada e um terceiro na outra extremidade da praça de armas, de
parede semi-esférica. A muralha
era formada por duas paredes de
1,5 m, unidas por 8 m de terra -a
primeira feita de seixo com caliça
(argamassa de concha triturada
queimada com areia) e a outra de
arenito de pedra lavrada. A fortaleza, que não disparou um único
tiro, foi demolida em 1845.
Sua localização foi feita no canteiro de obras de um dos dois edifícios-garagem do shopping Paço Alfândega, no Recife Antigo. Durante 45 dias, as arqueólogas
Suely Luna e Ana Nascimento, da
Universidade Federal Rural de
Pernambuco, e a arquiteta Patricia Nogueira trabalharam em
companhia de 18 estagiários e 20
operários, sob coordenação do arqueólogo e historiador Luiz Severino da Silva Júnior, do Instituto Ouricuri.
Autorizada pelo Iphan, a equipe escavou um buraco de 12 m x 8 m,
com profundidade máxima de 1,70 m, suficiente para identificar
o piso original do século 17, de seixo rolado, dois diferentes pisos de
tijoleira, dos séculos 18 e 19, e o piso de cimento datado de 1910,
época da grande reforma urbanística feita na cidade.
O resgate arqueológico localizou as bases do portal de entrada
e paredes do Forte do Matos.
Também resultou na coleta de 35 mil fragmentos de cerâmica (louça, porcelana, faiança), vértebra de baleia e ossos de animais variados e uma gama de utensílios diversos, como chaves, tesouras, cachimbos brasileiros e europeus,
garrafas de tinta francesas e uma navalha com cabo de osso. "Recolhemos também uma rica coleção de moedas e alguns botões de ouro", conta Silva Júnior, 32. "É uma amostra representativa do que foi
o cotidiano da área portuária nesse período", diz.
A descoberta das ruínas vai alterar o projeto do edifício-garagem,
de quatro pavimentos. Na nova
configuração, o piso do Memorial
Maurício de Nassau, a ser construído no espaço, será rebaixado
ao nível do original para permitir
que a muralha fique à mostra.
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