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São Paulo, quarta-feira, 13 de agosto de 2003

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ARTES PLÁSTICAS

Designer, que lança livro amanhã, critica modismos no ensino e comenta a procura da "cara" nacional

Para Wollner, Califórnia coloniza o Brasil

LUCRECIA ZAPPI
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Os lançamentos de dois livros, um sobre a trajetória de Alexandre Wollner, amanhã, e outro sobre Aloisio Magalhães, no dia 22, deixam claro como suas histórias se fundem para traçar a trajetória da vanguarda do design brasileiro.
A edição bilíngue "Alexandre Wollner - Design Visual 50 Anos" ilustra a vida do designer apoiado em amplo material fotográfico. Wollner define seu livro como um "objeto", pelo cuidado com que foi elaborado.
O designer teve seu talento reconhecido em 1953, ao vencer o "Prêmio Revelação de Pintura" da 2ª Bienal de São Paulo, ano em que conclui sua passagem pelo Instituto de Arte Contemporânea (IAC). Em 1954, partiu para Ulm, na Alemanha, para estudar na Escola Superior da Forma, com Max Bill, Josef Albers e Johannes Itten.
De volta em 1958, Wollner participou do desenvolvimento do design no Brasil, ao fundar a Esdi (Escola Superior de Desenho Industrial), no Rio, com Aloisio Magalhães e Flávio de Aquino.
Fundou também o primeiro escritório brasileiro de design, o Forminform, em São Paulo, com Geraldo de Barros, Rubens Martins e Walter Macedo.
Em entrevista à Folha, Alexandre Wollner, 75, fala sobre seu livro, sobre sua carreira, traça um panorama do design brasileiro e aponta modismos californianos no ensino nacional.
 

Folha - Qual seu interesse em estudar design numa época em que no Brasil mal se falava nisso?
Alexandre Wollner -
Eu já estudava numa escola de design [no IAC] mas ainda estava totalmente aéreo, pensando que era gravador. Depois eu descobri que estava fazendo um curso diferente, sobre design. Eu ajudei a montar a exposição do Max Bill no Masp em 1951, antes da primeira Bienal de São Paulo. Após a montagem, me deu um "clac", descobri o que queria fazer. Dois anos depois, [o professor do IAC Pietro Maria] Bardi me recomendou para estudar na escola dele, em Ulm.

Folha - E como foi essa experiência de voltar ao Brasil, em 1958?
Wollner -
Eu voltei para o Brasil entusiasmado. Havia um esforço de promover a cultura brasileira. Mas fora do país essa identidade é invisível. Ninguém conhece as verdadeiras referências culturais daqui, apenas as que estão absolutamente massificadas. Pelé, café, bunda de mulata, calçada de Copacabana. Isso é muito difundido, mas não define a cultura.

Folha - E como encontrar então essa "cara" brasileira?
Wollner -
Pois é, essa "cara" encontraríamos dentro de nossas universidades. Com pesquisas e auxílio de centros culturais, você pode procurar um caminho para essa identidade no design.

Folha - O Brasil tem cerca de cem escolas de design. É muito para o mercado?
Wollner -
É demais. O próprio Bardi, quando fez aquela escola no início dos anos 50, que durou três anos, percebeu que tinha formado 30 caras e não havia mercado de trabalho para eles. O aluno não vai ter acesso à indústria.

Folha - Existe um bom diálogo entre os arquitetos e os designers brasileiros?
Wollner -
É difícil. A profissão do designer não é reconhecida no Brasil, porque os arquitetos acham que quem se forma na faculdade Anhembi-Morumbi não tem a qualidade de alguém que se forma na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, sendo que na FAU não tem nem curso de design. Se perguntam para um sujeito que só trabalha com design qual é a sua profissão, ele diz que é arquiteto pelo status. É uma postura muito provinciana.

Folha - Seu livro pode ser considerado didático?
Wollner -
É um livro para o estudo e de informação, não é um livro de lazer.

Folha - É uma coincidência que dois livros importantes sobre o design sejam lançados apenas agora, num espaço de um mês entre eles?
Wollner -
Eu acho que os livros estão surgindo no tempo certo, agora tem um público para isso. O design gráfico pôde se expandir porque não está muito preso ao que é feito no exterior. Ele foi adiante, tem nível internacional.

Folha - Existe uma tendência no design brasileiro?
Wollner -
Nossas escolas estão sendo colonizadas por São Francisco, porque o gosto brasileiro se assemelha ao da Califórnia, sem compromisso. É uma moda e o design não tem nada a ver com moda, e sim com estética, que é apenas uma parte do design. Nós estamos "californicados" [risos].


ALEXANDRE WOLLNER - DESIGNER VISUAL 50 ANOS - Autor: Alexandre Wollner. Editora: Cosac & Naify. Prefácios de Décio Pignatari, Goebel Weyne e Laís Moura Wollner. Versão em inglês: Stephen Berg. Quanto: R$ 139 (336 págs.). Lançamento: amanhã, a partir de 19h30 no Masp (av. Paulista, 1.578, SP, tel. 0/xx/11/251-5644).


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