São Paulo, sexta-feira, 13 de agosto de 2010

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"Tortura na internet motivou o projeto"

Membro do duo iraniano-canadense Blurred Vision, Sepp diz que tecnologia é crucial para combater a opressão

"Hey, Ayatollah, Leave Those Kids Alone!" transforma professor em aiatolá e crianças em mulheres oprimidas


Rob Verhorst/Redferns
A banda de rock progressivo Pink Floyd em show do álbum "The Wall" (de que faz parte amúsica "Another Brick in the Wall"), em Londres, em 1980

MARCOS FLAMÍNIO PERES
DE SÃO PAULO

1979. No Reino Unido, vinha à luz "The Wall", o álbum conceitual do Pink Floyd que se tornaria um dos ícones da história do rock.
No Irã, a Revolução Islâmica comandada pelos mulás e aiatolás punha abaixo o governo secular e sangrento do xá Reza Pahlevi. "Another Brick in the Wall", o megahit de protesto do vinil da banda inglesa, rapidamente se transforma em referência para a juventude que saía às ruas da capital, Teerã.
2010. Dois irmãos iranianos cuja família se exilou no Canadá durante a revolução de 1979 recriam o clássico de Pink Floyd para atacar a opressão contra a mulher na sociedade de seu país.
Vitaminado pela polêmica em torno de Sakineh -que pode ser apedrejada até a morte por supostamente trair e assassinar o marido-, o vídeo do Blurred Vision (visão embaçada) rapidamente se torna sucesso no YouTube.
Às 12h07 de ontem, "Hey, Ayatollah, Leave Those Kids Alone!" (ei, aiatolá, deixe essas crianças em paz) -cruzamento bombástico entre o autoritarismo das salas de aulas britânicas do pós-guerra com a opressão do regime iraniano atual- já contava com 257.426 acessos.
Misturando ficção e cenas de violência contra manifestantes capturadas na internet, ele retrata uma jovem em fuga da perseguição de líderes religiosos.
Com um iPhone nas mãos, tenta passar desesperadamente, em tempo real, mensagens e imagens da opressão em seu país.
"A tecnologia é crucial para combater os regimes autoritários", diz Sepp, um dos membros do grupo. "O que nos motivou a realizar o projeto foram as cenas na web de mulheres sendo agredidas na cabeça ou torturadas", diz. "A ideia era captar a essência do que ocorre nas ruas do Irã e tornar o vídeo mais impactante", conclui.
Criador da versão original, Roger Waters, 66, se entusiasmou com o projeto desde o início. "Nosso herói", como Sepp define o baixista e vocalista do Pink Floyd, "nos levou a outro grau de determinação para tocar o projeto".

O CENTRO DA QUESTÃO
Com os parcos recursos da Universidade de Toronto, onde moram, foram atrás do premiado diretor Babak Payami, cuja carreira aborda os direitos da mulher.
O cineasta diz ter se inspirado abertamente no filme "The Wall", de 1982, dirigido por Alan Parker.
"Mas, para mim, o grande desafio era trabalhar com a versão do Blurred Vision sem repetir visualmente ou copiar o que já estava feito [por Parker]", diz Payami.
Na comparação dos dois vídeos, é evidente o paralelo entre as crianças humilhadas nas salas de aula (Pink Floyd) e as mulheres atacadas (Blurred Vision).
As mulheres, afirma Payami, "estão no centro do conflito nas sociedade religiosas repressivas, especialmente no contexto da repressão monoteísta".
Mas a música pode transformar balas em flores? Sepp abranda o tom messiânico e pondera: ""Pode ser. Mas o mais importantes é que ela pode nos revelar que coisas assim estão acontecendo no Irã -não só com Sakineh, mas com outros presos".


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