São Paulo, sábado, 13 de agosto de 2011

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Peça usa Stálin como metáfora para discutir poder e manipulação

Em "Cartas de Amor para Stálin", Bete Coelho vive ditador soviético e mulher de dramaturgo

Desesperado com a censura, autor soviético passa a interagir com a representação do líder político

GABRIELA MELLÃO
DE SÃO PAULO

O ditador Stálin era fã de Mikhail Bulgákov (1891-1940), um dos principais escritores e dramaturgos soviéticos da década de 1930. Assistiu à sua peça "Dias dos Turbins" 15 vezes. Mesmo assim, o submeteu ao ostracismo com a censura que paralisou os artistas do país.
Bulgákov recebeu um telefonema do ditador, que poderia mudar o destino do autor, mas a ligação caiu antes que seu motivo se explicitasse.
Esse fato é o ponto de partida de "Cartas de Amor para Stálin". Escrito às vésperas do ano 2000 pelo espanhol Juan Mayorga, o espetáculo estreia hoje em São Paulo com montagem da Cia. BR116 e direção de Paulo Dourado.
Para Bulgákov, Stálin simboliza a esperança de seu renascimento artístico. Obcecado pela figura do governante, o autor de "O Mestre e a Margarida" lhe escreve cartas diariamente. "Para um escritor, a censura equivale à pena de morte", confessa.
Sua mulher percebe o desespero. Na ânsia por ajudar o marido, passa a representar Stálin. Cria frases e discursos que possam auxiliá-lo a encontrar as palavras certas, capazes de reconduzi-lo à liberdade e, portanto, à vida.
Stálin se instaura no imaginário de Bulgákov. Os encontros passam a acontecer sem intermediação da mulher.
"Mayorga faz com que o ato teatral ganhe força e se materialize", explica a atriz Bete Coelho, que divide a cena com Ricardo Bittencourt e interpreta Stálin e também a mulher do protagonista.
Na fantasia de Bulgákov, Stálin chega a ditar trechos de suas cartas. Mayorga usa o líder soviético como metáfora para a manipulação das forças de poder. Busca discutir sobre a condição do artista e a maneira como a obra de arte é moldada por exigências externas, inclusive no mundo democrático e atual.
"Como escritor, me pergunto a cada dia se não estarei escrevendo o ditado dos outros. Como cidadão, me pergunto se meus atos não terão sido escolhidos pelos outros", afirma Mayorga.
Bete Coelho reflete sobre as censuras veladas da sociedade: "O cidadão é a todo momento comprado, corrompido e manipulado".

CARTAS DE AMOR PARA STÁLIN
QUANDO sex. e sáb., às 21h; dom., às 18h; até 18/9
ONDE Sesc Santana (av. Luiz Dumont Villares, 579, tel. 0/xx/11/2971-8700)
QUANTO de R$ 5 a R$ 20
CLASSIFICAÇÃO 14 anos


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