São Paulo, domingo, 13 de dezembro de 2009

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Negócio dos sonhos

Principais canais de TV aberta investem em programas assistencialistas, que garantem boa audiência e anunciantes

Edu Chahestian/TV Record
Entrega de casa do quadro "Sonhar Mais um Sonho", do "Programa do Gugu", exibido aos domingos pela Record

RODRIGO RUSSO
DA REPORTAGEM LOCAL

Mesmo sem renovar ideias ou formatos, os programas do fim de semana que apostam no assistencialismo -ou na solidariedade, como preferem se caracterizar- estão se consolidando como um bom negócio para emissoras e anunciantes.
Atualmente, as três maiores emissoras de TV aberta do país -Globo, Record e SBT- têm quadros desse gênero. "Caldeirão do Huck" (Globo), "Programa do Gugu" (Record) e "Domingo Legal" (SBT), com quadros que investem na mudança de casas e carros, se destacam neste cenário.
É quase uma sequência: como os programas de transformação têm bons índices de audiência, geralmente acima de dez pontos no Ibope, não faltam anunciantes e patrocinadores -ou parceiros, no linguajar das TVs. Com a boa audiência e bons patrocínios, justificam-se os investimentos das emissoras.
Aqui, aparece a primeira -e talvez principal- diferença entre os quadros: o orçamento. Com estrutura mais modesta, o "Construindo um Sonho", apresentado por Celso Portiolli no SBT, tem nas parcerias com empresas o principal meio de financiar as reformas e garante média de oito pontos entre as 11h e 14h45 do domingo.
"Tem casa que sai de graça para nossa produção", conta Roberto Manzoni, o Magrão, diretor do "Domingo Legal". Estima-se que a reforma de uma casa ou apartamento não saia por menos de R$ 100 mil.
Para isso, usam das permutas: em troca da cessão de materiais, móveis e eletrodomésticos (às vezes também há algum suporte financeiro para mão de obra), o canal cita os fornecedores durante o quadro, além de incluí-los em uma extensa lista de agradecimentos.

Merchandising
Muitas vezes, as permutas evoluem para ações de merchandising, em que o anunciante também paga pela inserção de seu produto. É com base nesse modelo que funciona o "Lar Doce Lar", quadro apresentado por Luciano Huck em seu "Caldeirão" desde 2006. Neste ano, o programa tem média de 18 pontos no Ibope nacional, enquanto concorrentes de horário não chegam a dez.
Em breve conversa, o apresentador lembra de cabeça cinco parcerias, que vão de eletrodomésticos a móveis. Além disso, conta com a maior grife entre os concorrentes: o arquiteto Marcelo Rosenbaum, responsável por agregar conceitos funcionais às casas, geralmente entregues a classes mais baixas.
Com menor número de merchandisings, mas contando com maior orçamento da emissora, o "Programa do Gugu", que estreou no fim de agosto na Record e tem índices próximos de 12 pontos na audiência, com picos de 17, levou do SBT o formato que já usava, e trocou o nome para "Sonhar Mais um Sonho". Gugu também faz "De Volta pro Meu Aconchego", em que leva famílias carentes de volta para as cidades natais.
A diretora nacional de mídia da agência de publicidade F/ Nazca, Lica Bueno, conta que esse tipo de quadro, visto com receio inicialmente por se concentrar em camadas populares, hoje tem grande aceitação no mercado. "A ação do patrocinador soa muito menos forçada do que em uma novela, já que há todo um contexto envolvido. Além disso, é sempre bom associar-se a melhoras significativas na imagem de uma casa."

"Quero mudar minha vida"
Mas por qual razão esses quadros cativam a audiência? Lica formula uma hipótese: "A frase "quero mudar minha vida" tem grande penetração nas classes C e D, e esses programas são boa representação disso".
Ainda segundo ela, os programas são uma oportunidade de sonhar, de ter esperança de que a mudança aconteça também para o público -embora as chances sejam remotas.
"Nós devolvemos um pouco de vida e de dignidade para essas pessoas, especialmente para os mais velhos", diz Homero Salles, diretor de Gugu.
Para Luciano Huck, "o que menos importa é a reforma em si. Isso é uma ferramenta para contarmos boas histórias -o que todo mundo tem". Caso sejam dramáticas, melhor ainda -para o programa, os anunciantes e a audiência.


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