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LIVROS
HISTÓRIA
Muitos episódios secundários prejudicam título, que lembra um romance
Revolução de 30 ganha cor e perde foco em novo estudo
OSCAR PILAGALLO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Uma das mais profundas inflexões do Brasil no século
passado, a Revolução de 30 é objeto de extensa bibliografia. O evento, que marca o fim da República
Velha e o ingresso do país num
mundo que o levaria à modernidade, foi contado a partir de diversos recortes históricos, gerou
teses acadêmicas divergentes,
seus protagonistas ganharam biografias. Um novo livro sobre o tema precisaria, portanto, buscar
um enfoque diferente para se justificar. Em "1930 - Os Órfãos da
Revolução", Domingos Meirelles
fez isso ao optar por um tratamento híbrido: baseado em extensa pesquisa, apresenta-a num
formato que com freqüência se
aproxima do romance.
Meirelles, autor de "As Noites
das Grandes Fogueiras - Uma
História da Coluna Prestes", fez
bem em retroceder só até 1927, no
início do governo Washington
Luís. A historiografia prefere começar em 1922, com o fracassado
levante do Forte Copacabana, que
deu visibilidade ao movimento
tenentista, um dos componentes
da heterogênea coalizão que derrubaria a oligarquia paulista e mineira que se revezava no poder.
Os tenentes ainda provocariam
uma guerra civil em São Paulo,
em 1924, e percorreriam o país na
Coluna Prestes, a partir do ano seguinte. É em 1927, porém, que
passam a convergir as forças dispersas que se opõem ao regime.
Ao assumir, Washington Luís
suspendeu o estado de sítio que
vigorara durante quase todo o
mandato de seu antecessor, Artur
Bernardes. Causou a falsa impressão de que o ambiente político seria desanuviado. Aristocrata empedernido, Washington Luís não
daria trégua ao movimento sindical e perseguiria o então incipiente Partido Comunista Brasileiro.
Quantos aos tenentes, nunca saíram da mira do governo. Além
disso, o presidente desrespeitou o
acordo que sustentava a República Velha ao impor como sucessor
um outro representante de São
Paulo, Júlio Prestes. O descontentamento nas duas pontas da sociedade organizada daria origem
à Aliança Liberal, com Getúlio
Vargas como figura de proa.
Os órfãos a que se refere Meirelles são aqueles que, tendo acreditado na campanha moralizante
dos tenentistas, não tiveram seus
interesses contemplados pelo novo governo. Cooptados por uma
oligarquia dissidente, os tenentes,
que nunca tiveram um ideário
político claro, deixariam de lado a
pauta que os aproximava da classe média. A idéia de órfãos da revolução não é nova, faz até eco à
"revolução traída" de Hélio Silva.
O autor, de qualquer maneira,
não pretendeu apresentar uma tese. Seu interesse é recuperar uma
história rica em acontecimentos.
A narração de muitos episódios
secundários contribui para a
construção do painel histórico e
dá vida aos protagonistas. Oswaldo Aranha, o artífice da aliança,
João Pessoa, cujo assassinato deflagrou a revolução, Luís Carlos
Prestes, o herói que rejeitou o
acordo com os civis, todos emergem como personagens de quem
o leitor se sente próximo, embora
o recurso da ficção, atribuindo a
eles pensamentos não acessíveis,
nem sempre funcione.
Várias passagens, porém, têm
efeito inverso. Introduzem casos
por vezes remotamente ligados à
trama principal, turvando o foco
da narrativa. A descrição da morte de Lênin, os detalhes do caso
Sacco e Vanzetti ou a morte misteriosa de uma jovem e bonita
marquesa italiana no Copacabana
Palace, para citar poucos exemplos, são parênteses que, embora
em si saborosos, comprometem a
fluência do livro.
Oscar Pilagallo é jornalista, editor da
revista "EntreLivros" e autor de "A História do Brasil no Século 20" e "O Brasil em Sobressalto" (Publifolha)
1930 - Os Órfãos da Revolução
Autor: Domingos Meirelles
Editora: Record
Quanto: R$ 69,90 (770 págs.)
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