São Paulo, sábado, 14 de março de 2009

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Violência e paixão

Finalista dos maiores prêmios literários do país em 2008, Beatriz Bracher estreia em contos com "Meu Amor", em que afeto e crueldade se confundem

Filipe Redondo/Folha Imagem
A escritora paulistana Beatriz Bracher, 47, lança seu quarto livro

RAQUEL COZER
DA REPORTAGEM LOCAL

As letras se repetiam nos nomes -Isabella, Anna, Vila Isolina Mazzei-, assim como imagens e depoimentos reincidiam no noticiário. Em algum momento, para a escritora paulistana Beatriz Bracher, aquele derramamento de informações fez a realidade parecer ficção.
A violência explícita na morte de Isabella Nardoni, 5, e a comoção causada pela história da menina, jogada da janela do prédio onde viviam o pai e a madrasta, são um exemplo do encontro entre a crueldade e a paixão no primeiro livro de contos da autora, "Meu Amor".
Finalista dos maiores prêmios literários do país em 2008 com o romance "Antonio", Bracher estreia agora em narrativas curtas ficcionalizando casos que a "tocaram", mas também criando tramas em que "amor rima com dor, como diz a música ["Mora na Filosofia']".
Entre essas últimas estão a história de um garoto que, levado à Febem (atual Fundação Casa), ecoa os lugares-comuns repetidos pela mãe ("Foi uma facada no meu coração"); e a de um homem que, tentado pela presença da filha ainda menina, exime-se da culpa de seu desejo ao questionar os laços sanguíneos: "Que homem alguma vez soube [se é de fato o pai]?".
Quanto ao outro extremo, o amor, Bracher admite que correu o risco "de ser muito Roberto Carlos". "Eu sei, foi arriscado encerrar o livro com um poema chamado "My Love" [risos]. Queria pegar o romântico demais, a ponto de ser insignificante, e inseri-lo num contexto em que voltasse a ter vida."
Outro desafio foi dar voz a vários narradores, multiplicando o que já havia experimentado em "Antonio". "É difícil saber se criei uma voz convincente. No conto da Febem, por exemplo, por ser o personagem mais distante de mim, homem, jovem, pobre, negro, busquei pensar na aflição, naqueles sentimentos comuns a todos", diz Bracher, 47, em sua casa no Alto de Pinheiros, em São Paulo.
Uma das fundadoras da Editora 34, da qual saiu em 2000 e que hoje publica seus livros, ela explica seu interesse por tais "aflições". "Já me perguntaram: "Você tem uma vida boa, por que escreve coisas tão tristes?" Acho que a literatura precisa de algo trágico, um pouco mau", avalia Bracher.
Ela também abordou a violência nos roteiros de "Cronicamente Inviável" (2000) e "Os Inquilinos" (em finalização), que assina com Sergio Bianchi. Se não atos extremos, ao menos a culpa ressalta em seus dois primeiros livros, "Azul e Dura" (7Letras, 2002) e "Não Falei" (34, 2004) -respectivamente, a de uma mulher bem-nascida que mata sem querer uma deficiente e a de um homem acusado de ter entregue o cunhado durante a ditadura militar.

Concorrência
A estreia em contos Bracher adiou por considerar o formato mais "elevado" que o do romance -tentou os primeiros, que estão na coletânea, a convites de jornais e revistas. Os prêmios, imagina, devem ser difíceis neste ano. "O que se diz no meio literário é que, em ano em que Milton Hatoum lança livro, você pode esquecer os prêmios." Hatoum acaba de lançar, pela Companhia das Letras, os contos de "A Cidade Ilhada".


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