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LIVROS
Crítica/"Poesia"
Erudita, poesia de Borges é mais variada do que a sua prosa
Com tradução precisa de Josely Vianna Baptista para o português, volume reúne sete livros do escritor argentino
MÔNICA RODRIGUES DA COSTA
ESPECIAL PARA A FOLHA
O volume "Poesia" reúne
sete livros do argentino Jorge Luis Borges,
traduzidos por Josely Vianna
Baptista. Integra a Biblioteca
Borges, série da Companhia
das Letras que desde 2007 publica a obra do escritor.
Borges (1899-1986) é um dos
maiores escritores de contos e
também produziu ensaios, traduções e poemas. Reinventou a
escrita da perspectiva da duplicação do sujeito, aquele que escreve uma espécie de sósia de
textos preexistentes, e questionou a autoria do texto literário
-ou de qualquer obra de arte-
na cultura ocidental.
Como avalia Lars Olsen, especialista no autor argentino,
ele faz parte de uma linhagem
de artistas, escritores, poetas e
filósofos que se caracterizam
por criar uma estética do artifício. Para esses estetas, o artifício é uma "verdade" da existência, pois é factum: fato e ao mesmo tempo "facturado", feito.
Nesse contexto, os poemas
de Borges encontram-se como
artifícios de formulação desse
sujeito que narra. Ele se vale
das tradições literária e historiográfica para tramar múltiplas subjetividades e, assim,
encontrar, no manuseio das palavras, os seus próprios sujeitos
e o "eu" lírico. Um exemplo é o
soneto "James Joyce", que, por
meio da métrica e do universo
joyceano como ponto de embarque, atinge alto grau de lirismo e plasticidade imagética.
Clássico e moderno
Sua poética varia entre formas clássicas e modernas -como o verso livre quase "entupido" com prosa, ou, em prosa, a
canção popular portenha (a milonga) e um tratamento de imagem próximo do surrealismo. O
tom, em geral, elevado, tem sabor neoclássico na escolha vocabular, no uso de terzas e decassílabos, embora o autor empregue redondilhas maiores.
No livro "O Ouro dos Tigres",
há uma série de tankas (forma
clássica da poesia japonesa),
trabalhados com coloquialismo
característico da técnica moderna. Alguns poemas, como
"Um Poeta Menor", do conjunto "Treze Moedas", lembram as
formas curtas de Oswald de Andrade.
A poesia de Borges é
marcada por traços em comum
com o tango argentino, sobretudo o tango moderno de Piazzolla, de lirismo abrupto, sintético e irônico, pelo tratamento
moderno das formas clássicas e
pelo conhecimento da tradição
-objeto de ressonância no trabalho com a linguagem.
O Borges que foi ponto de
partida para pensadores como
Foucault, Deleuze e Eco é o
contista. Embora sua poesia seja de extrema erudição, é mais
heterogênea que a prosa e só
em alguns momentos conquista densidade. A importância de
se ter em português a poesia de
Borges é grande, pois ela nasce
de sua prosa e ficção, relevante
para a compreensão do mundo
atual, que põe em questão o ato
da escrita e da leitura.
A tradução de Baptista, poeta
de "Ar" e "Poros Floridos", é
mais precisa que, por exemplo,
a tradução para o português europeu feita por Fernando Pinto
do Amaral (ed. Teorema). Baptista persegue com entusiasmo
e precisão o ritmo e a métrica
dos poemas e submete o texto à
escolha do tom, mais clássico e
literário, do original.
Tradutora
de Borges há mais de dez anos,
já verteu Roa Bastos, José Lezama Lima, Julio Cortázar,
Guillermo Giucci e Cabrera Infante -e recebeu o Jabuti por
traduções de Borges em 1998.
MÔNICA RODRIGUES DA COSTA é poeta, autora de "O que (se) Passa" (Iluminuras).
POESIA
Autor: Jorge Luis Borges
Tradução: Josely Vianna Baptista
Editora: Companhia das Letras
Quanto: R$ 65 (648 págs.)
Avaliação: ótimo
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