São Paulo, sexta-feira, 14 de abril de 2000


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"AMOR MAIOR QUE A VIDA"

Medo de ser Zeffirelli

PAULO VIEIRA
especial para a Folha

Há o garoto ambicioso, que faz Harvard e sonha ser presidente dos EUA, nem que para isso tenha que lutar no Vietnã; há a menina de bom coração, que reprova os políticos, ajuda as crianças desassistidas e exilados chilenos. Um amor que se insinua impossível surge entre os dois nos anos 70.
Fielding (Billy Crudup) acaba por se tornar senador democrata uma década depois, mas vive amargurado, vendo sua ex-namorada em todas as esquinas nevadas de Chicago. Só que Sarah (Jennifer Connelly) explodiu junto com um carro e um casal de allendistas.
Não se trata de uma crise de identidade: Fielding não inveja o irmão porra-louca, tem sérias restrições aos católicos, é xenófobo e desconsidera haver lugar fora dos EUA onde haja ascensão social e democracia. Mostra-se orgulhoso de sua ambição.
Moldando seu protagonista assim, o diretor Keith Gordon evitou cair numa armadilha: humanizar Fielding demais, torná-lo torturado pela consciência. Seu único problema foi ter perdido a namorada-antítese, com quem teria vivido, ainda que rapidamente, a sonhada plenitude.
Esclarecido isso, lá pelo meio da projeção, o filme revela sua verdadeira intenção: trata-se de uma "love story". Mas "love-stories" pedem mais compulsão, plangência, volteios em torno de um único eixo -a paixão e a impossibilidade dela.
"Amor Maior que a Vida" não parece estar satisfeito em ser apenas mais um filme do gênero e fica a se disfarçar com conteúdos pseudopolíticos, recriações levianas de época, zigue-zagues no tempo, argumentações teóricas desprezíveis.
É um recurso que parece impor mais "densidade" à obra. Um atentado a chilenos remete a um evento real, transcorrido nos EUA -o caso Letelier-, mas que nada por cento dos americanos, se tanto, conhece (por falar neles, alguém, no filme, diz: "Americanos, não, Fielding, norte-americanos").
Imagens de uma campanha também parecem ocupar, no imaginário de Hollywood, um conteúdo de crítica de um grande tema. Por fim, há o pulo geracional, simbolizado pelos cabelos metamorfoseados do irmão maluco. Simples artifícios para não deixar perfeitamente claro o objetivo lacrimoso da produção.
Afinal, não deve ficar bem para um diretor sem grande currículo -e que pode vir a ganhar um Oscar em cinco anos-, num país cujo cinema é tão incrivelmente combativo, vide o Oscar deste ano, soar logo de cara como Franco Zeffirelli.


Avaliação: 

Filme: Amor Maior que a Vida
Título original: Waking the Dead
Produção: EUA, 1999
Diretor: Keith Gordon
Com: Billy Crudup, Jennifer Connelly
Quando: a partir de hoje nos cines Belas Artes/sala Mário de Andrade, Eldorado 6 e circuito


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