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Evento debaterá pluralização, diz Salles
DO ENVIADO A CANNES
O diretor Walter Salles participa do júri desta edição de Cannes,
ao lado dos realizadores David
Lynch (EUA), que presidirá o
grupo, Raoul Ruiz (Chile), Bille
August (Dinamarca), Claude Miller (França), Régis Wargnier
(França) e Christine Hakim (Indonésia) e das atrizes Sharon Stone (EUA) e Michelle Yeoh (China). Salles fala, a seguir, das características do festival neste ano e do
significado de Cannes para o cinema mundial.
(ALN)
Folha - O que deve marcar o Festival de Cannes deste ano?
Walter Salles - Deve ser um festival com uma conotação política
acentuada, não só pelo susto
ocorrido nas eleições francesas,
mas também pelo debate em torno da exceção cultural na França,
a partir da crise no Canal Plus.
O que está em jogo hoje é a defesa da diversidade audiovisual. E
Cannes é justamente isso: é o debate a respeito da pluralização da
cultura e da necessidade de resistência. De um lado, temos todos
aqueles que defendem a necessidade de um cinema europeu financiado pelo Estado, ou regulamentado por ele, que é a única
forma de assegurar uma diversidade de expressão. De outro, os
que, como Jean-Marie Messier,
presidente da Vivendi-Universal
e proprietário do Canal Plus, pregam o contrário, ou seja, um alinhamento da produção cinematográfica francesa e européia com
o mercado.
A presença de David Lynch na
presidência do júri aponta nessa
direção, já que foi ele quem capitaneou as assinaturas de dezenas
de cineastas contra o fim da exceção cultural e contra as possíveis
mudanças no Canal Plus.
Folha - Seus próprios filmes foram produzidos com participação
francesa, não?
Salles - Sim. Desde "Central do
Brasil" que os filmes que tenho
feito têm participação direta ou
indireta da França, como no caso
de "O Primeiro Dia", produzido
com a emissora Arte, "Central do
Brasil", com o Canal Plus, e "Abril
Despedaçado", feito com a produtora Bac Films. Mas boa parte
do que se faz de interessante, de
Lynch a Theo Angelopoulos, passa pela França, e não só pelos 150
filmes que o país lança por ano.
Folha - Cannes é um festival antiamericano?
Salles - Oitocentos filmes são
submetidos ao festival, aspirando
a serem exibidos em Cannes. Isso
prova que toda a cinematografia
quer fazer parte do evento, seja ela
iraniana, americana, chinesa ou
brasileira. Uma outra tendência
interessante deste festival é o interesse pelo cinema latino-americano. Dois filmes de cineastas jovens argentinos estarão neste ano
em mostras não competitivas, "El
Bonaerense", de Pablo Trapero, e
"Un Orso Rojo", de Israel Adrian
Caetano. Há também dois filmes
de jovens realizadores brasileiros,
"Cidade de Deus", de Fernando
Meirelles, e "Madame Satã", de
Karim Aïnouz. Se lembrarmos
que Raoul Ruiz vem do Chile, embora esteja filmando há 20 anos
na França, teremos dois latino-americanos no júri. O Festival de
Cannes tem olhado a América Latina cada vez com mais atenção.
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