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TELEVISÃO
Seriados e longas-metragens independentes buscam identificação com o público criando heróis entre fracassados
Perdedores conquistam sucesso em novas produções
CARYN JAMES
DO "NEW YORK TIMES"
Será que os Estados Unidos estão, enfim, preparados para abraçar o perdedor que existe lá dentro? De Benjamin Franklin a Horatio Alger, chegando a "American Idol" e "O Aprendiz", a história de sucesso em formato da lama à fama tem sido um mito essencial na cultura do país.
Mas agora a mais audaciosa heroína da TV é Lisa Kudrow no papel de uma atriz em busca desesperada pelo estrelato perdido em
"The Comeback" (o retorno), novo seriado da HBO. O programa
ecoa, sem que obtenha qualidade
semelhante, à tragicomédia da série britânica "The Office", sobre
um irritante executivo de médio
escalão que não tem para onde ir a
não ser para baixo.
Um dos sucessos mais surpreendentes entre os filmes cult
do ano passado foi "Napoleon
Dynamite", a história de um bundão na escola secundária que ignora completamente a sua condição de perdedor. E uma variante
do tema aplicado à meia-idade está nas telas agora em "Second
Best", um filme independente estrelado por Joe Pantoliano como
um sujeito que se anima tanto
com o fracasso que publica um
boletim para perdedores, colando
exemplares nos postes da cidade e
operando um site.
Na companhia de "Fat Actress",
série estrelada por Kirstie Alley, e
da versão norte-americana de
"The Office", esses trabalhos criaram um momento em que ser um
perdedor parece elegante e em
que se admitem heróis sem a menor chance de vencer.
Quando essa elegância dos perdedores funciona, como no caso
de "The Comeback" e do "The
Office" original, os personagens
não são patéticos, mas pungentes
e dignos de afeição, pessoas que se
esforçam perpetuamente para
conquistar nosso respeito. Esses
heróis oferecem alguma folga à
imagem de perfeição que pode
parecer como um ataque da mídia às pessoas comuns.
Como aponta Scott A. Sandage
em seu livro "Born Losers: A History of Failure in America" (nascidos perdedores: uma história do
fracasso nos Estados Unidos), o
significado da palavra "fracasso"
evoluiu desde o começo do século
19, quando ela se referia apenas a
perdas em uma empreitada comercial. Gradualmente, ser um
perdedor passou a sugerir igualmente uma falha de caráter, a falta
do ímpeto de aperfeiçoamento
que o prestígio recente da condição de perdedor desmistifica.
O perdedor atingiu a glória, em
termos humorísticos, com o personagem do vagabundo criado
por Charlie Chaplin. Mas, além de
atacar a idéia de que os fracassados merecem os problemas que
sofrem, as comédias atuais parecem se voltar também contra a
idéia de que fama equivale a sucesso; quase todos os fracassados
recentes das telas exibem ambições no ramo do entretenimento.
Em "The Comeback", Kudrow
(Valerie) perde o posto de "gostosa" em um novo seriado e é escalada para viver a vizinha feiosa.
Mas a atriz continua a se comportar como a diva que acredita ser.
O desempenho elegantemente
balanceado de Kudrow traz uma
teimosia que não é gerida pelo
ego, mas por uma afirmação de
que Valerie importa pelo menos
tanto quanto as novas estrelinhas
burraldas do pedaço. O defeito
trágico dela é a sua incapacidade
de se distanciar de seu sucesso no
mundo do entretenimento.
O desafio na criação de heróis
perdedores é manter o envolvimento dos telespectadores e tornar palatável os fracassos um tanto repelentes dos personagens. E é
nesse ponto que o humor eleva ou
condena uma produção.
Em "The Comeback", a idiotice
do mundo dos seriados cômicos é
exposta em detalhes devastadores. Em ambas as versões de "The
Office", as inanidades do local de
trabalho são capturadas de maneira mordaz, no tédio mortal dos
funcionários e em sua descrença
inerte diante da atitude sempre
otimista do chefe.
O perdedor simpático é incorporado em sua melhor forma por
Bill Murray como o ator decadente em "Encontros e Desencontros", de Sofia Coppola, e o oceanógrafo de uma série de documentários televisivos (sim, até o
oceanógrafo é um astro da mídia)
em "A Vida Marinha com Steve
Zissou", de Wes Anderson.
A inteligência do roteiro, a tolice
de Zissou com seu boné vermelho
da equipe Zissou e o impecável
equilíbrio entre comédia e tristeza
oferecido por Murray é que seguram o filme. Se essa maestria não
está presente, o perdedor é apenas
um fanfarrão desagradável.
Em "Second Best", Pantoliano
interpreta um ex-executivo do setor editorial que se cerca de muitos amigos perdedores e um bem-sucedido, um produtor de Hollywood em visita (mais mídia).
Mas os epigramas dos perdedores não são tão sarcásticos ou sábios quando o filme pretende
-"o maior dos perdedores põe
tudo para fora" captura o nível de
texto-, e assim a premissa do filme é mais interessante do que o
resultado final. E a versão fictícia
de Kirstie Alley para ela mesma
em "Fat Actress" era resmungona
e estridente demais para funcionar bem durante toda a série.
O pior e o melhor
A maneira mais astuciosa de
transformar um perdedor em
personagem de sucesso de audiência ou bilheteria é percorrer a
mais perigosa das cordas bambas
e permitir que os telespectadores
tenham o pior e o melhor no mesmo pacote.
"Napoleon Dynamite" e "American Idol" prosperaram ao apresentar personagens com os quais
as audiências podem se identificar ou tomar como alvo de zombaria. (E a escolha pode ser um segredinho pessoal de cada um.)
Muitos telespectadores são viciados na fase de testes iniciais de
"American Idol", quando os piores se apresentam. William Hung
chegou a encontrar espaço para
sua falta incomparável de talento
em um CD. Os rejeitados de
"American Idol" e "Napoleon",
excessivamente confiante e socialmente desajustado, formam
um padrão: perdedores que insistem em ser o que são.
A mensagem reconfortante é
que perder pode ter sua graça.
Mas existe outra mensagem. Alley
reverteu a decadência de sua carreira ao interpretar uma perdedora e, não importa o que aconteça
com "The Comeback", Kudrow
ainda tem o sucesso de "Friends".
O perdedor como herói pode ser
reconfortante, mas não esqueçamos que se trata de ficção.
Tradução Luiz Roberto Mendes Gonçalves
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