São Paulo, terça-feira, 14 de junho de 2011

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OPINIÃO

Extensão do talento do cineasta inglês vai além das obras de sua grande fase

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

O exemplo mais perfeito do talento de Alfred Hitchcock não se encontra em "Um Corpo que Cai" nem em "Janela Indiscreta" ou qualquer outra obra da sua grande fase. Ele se encontra em "Chantagem e Confissão" ("Blackmail"), de 1929.
Era para ser um filme mudo. Mas Hitchcock, homem extremamente precavido e avesso a surpresas, previu a possibilidade de o filme se tornar falado e preparou-se para as duas hipóteses.
Não deu outra: com o filme já começado, o produtor optou por tornar o filme sonoro.
Hitchcock preparara tudo, mas algo de importante lhe escapara: Anny Ondra, a atriz principal, era estrangeira, o que forçou Hitchcock a usar sua astúcia para resolver o problema: colocou uma atriz ao lado da câmera, dublando Ondra no mesmo momento em que ela falava.
Na notável mostra que se abre hoje no CCBB, esse momento de alta criatividade e técnica poderá ser conferido em toda a sua extensão.
A mostra, aliás, traz a retrospectiva completa dos longas do grande mestre, o que inclui o raro (e fraquíssimo, ele mesmo achava) "Valsas de Viena", um musical de 1933 que, em definitivo, nada tinha a ver com seu estilo.
De resto, Hitchcock não esperou o cinema falado para manifestar a extensão de seu gênio. Desde a sua estreia, com "O Jardim dos Prazeres", o estilo fluente e a elegância do enquadramento já eram visíveis.
Seu cinema, disseram os críticos da época, parecia mais americano do que inglês (o cinema inglês era, desde então, um tanto fracote). Eles o chamaram, por sinal, "the young man with a master mind" (um jovem com cabeça de mestre).

MÉTODO
O método do suspense, ao qual o autor foi fiel durante toda a vida, surgiu no ano seguinte. Ao contrário de diretores capazes de trabalhar com vários gêneros, Hitchcock criou inúmeras variantes dentro do mesmo gênero.
Houve poucas exceções, como "Rebecca" (1940), neste porque estava sob a vigilância de David O. Selznick.
Selznick o levara aos EUA em 1939. A partir daí, ele teria de se adaptar a um novo país, a Hollywood e a seus métodos. Na verdade, Hollywood logo percebeu que melhor (e mais lucrativo) seria dobrar-se aos métodos de Hitchcock. Apenas Selznick resistiu.
Quando entra nos anos 1950, já livre do contrato com Selznick, Hitchcock encontra-se na plenitude do domínio de suas ideias e da técnica, já dispõe também de toda segurança.
É quando, uma após outra, compõe suas maiores obras: "Janela Indiscreta", "O Homem que Sabia Demais", "O Homem Errado", "Um Corpo que Cai", "Psicose", "Os Pássaros", "Marnie, Confissões de uma Ladra", "Frenesi"... Como pedir mais?
E, no entanto, a retrospectiva mostrará, há muito mais.


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