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Shakespeare nas sombras
Japoneses e colombianos mostram versões do dramaturgo em São José do Rio Preto
VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
Do lado oriental do planeta,
vem uma das tragédias mais
montadas de Shakespeare,
"Hamlet". Do lado ocidental, desponta um dos textos menos conhecidos do dramaturgo inglês,
"Titus Andronicus". Ambos convergem para o Brasil.
São releituras que despertam
curiosidade entre os espetáculos
da primeira semana do Festival
Internacional de Teatro de São José do Rio Preto, que começa amanhã e segue até o dia 25 na cidade
do interior paulista.
Com sede em Tóquio, o grupo T
Factory toma como base o "Hamlet" original, do século 16, e estabelece uma fusão com o "Hamlet-Machine", do alemão Heiner Müller, de 1977.
O diretor Takeshi Kawamura
faz essa ponte para reconsiderar
aspectos da sociedade japonesa
contemporânea, na qual as referências visuais e tecnológicas são
determinantes.
Na adaptação, um rapaz morador de Tóquio decide desempenhar o papel de Hamlet e designa
membros de sua família para contracenar. São 13 atores. Para Kawamura, esse homem que busca
vingar a morte do pai, tramada
pelo tio ora casado com sua mãe,
remete a rupturas familiares que
colocam em xeque as tradições de
seu país atual.
Uma bicicleta, tacos de beisebol,
cadeira de rodas e grades de ferro
que sugerem uma prisão fazem
parte da lista de material cenográfico que o T Factory pediu à produção do festival. A cenografia é
de Tsukasa Nakagoshi. "Eu considero recursos tecnológicos, efeitos de luz e som, por exemplo, como extensão do corpo", diz Kawamura, 44.
A dança (coreografias de Yoko
Iida) e a música (composições de
Eiji Sugiura) são outros elementos fundamentais para o painel
crítico e social que o encenador
pretende estabelecer a partir do
clássico shakespeariano. Não é à
toa que boa parte das cenas de
"Hamlet Clone" acontece sob penumbra.
"Reflexo da violência explicitada no texto, violências moral e física", diz o diretor. A montagem
estreou em 2000, após um ano de
pesquisa. É a primeira vez que o
grupo de Kawamura se apresenta
na América do Sul. Ela nada conhece sobre o teatro brasileiro.
Além de Rio Preto, está programada uma única sessão de "Hamlet Clone" no Sesc Vila Mariana,
em São Paulo, no dia 21/7.
O grupo nasceu como Daisan
Erotica, em 1980, e mudou de nome em 2002. T Factory é uma referência à "fábrica teatral" de Takeshi Kawamura.
Já o grupo Petra, criado em 1985
na Colômbia, participou em maio
do Festival Internacional de Teatro de Londrina com "Mosca" e
volta ao país com sua versão de
"Titus Andronicus" (1592).
A obra de Shakespeare expõe
uma trégua entre duas famílias
depois da guerra. Antes desse
pacto, porém, sucedem mais raptos, violações, torturas, mutilações, traições, assassinatos. Numa
das passagens, cabeças são servida à mesa do general Titus.
Na sua adaptação, o diretor e
ator Fabio Rubiano Orjuela trata
o horror com paródia. A intenção
é "banalizar as atrocidades com o
desejo irônico que ridiculariza os
protagonistas da história".
Essa linha sugere aproximação
com a montagem paulista que o
diretor Márcio Tadeu e o grupo
Benditos Malditos levam ao teatro Arthur Azevedo, na Mooca:
"TITU.S. - Persona non Grata".
A terceira e derradeira atração
estrangeira do festival é o solo
americano "Clothes, Calls and
Cunning Stunts" (algo como
Roupas, Telefonemas e Manobras
Astutas), com a performer Pat
Oleszko, que costuma desenvolver uma dramaturgia com registros autobiográficos: fala de si, invariavelmente, para chegar ao outro por meio de linguagens como
a arte da rua, as festas populares e
até museus de arte.
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