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Crítica/ensaio
Autor suíço destaca vigor da poesia oral
NOEMI JAFFE
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Numa das definições
mais belas e precisas
sobre a importância da
inutilidade da arte, Octavio Paz
diz que "a metáfora é a língua
erotizada" e que "o erotismo é o
sexo metaforizado". Nem a
poesia nem o erotismo servem
para nada. Nenhum dos dois
serve a nada. É seu maior serviço: desfazer os utilitarismos.
O suíço Paul Zumthor, em
seu livro "Performance, Percepção e Leitura", também dá
conta do erotismo presente na
poesia, especialmente naquilo
que ela mantém de oral e vocal.
Tanto a poesia é o território da
voz como a voz é uma potência
poética. O autor mostra a
opressão que a voz vem sofrendo, desde o final da Idade Média, pela hegemonia da escrita e
do pensamento fixo e abstrato.
O interlocutor, sua fugacidade e concretude se ausentam,
em troca de uma palavra mais
mensurável e poderosa na distância e na solidão do texto escrito. As novas tecnologias da
comunicação, para ele, podem
assim ser interpretadas como
uma "ressurgência das energias
vocais da humanidade".
O corpo, inutilizado pela escrita, é aquele que reage, com
seu peso, volume e densidade,
quando a palavra provoca prazer, lembranças, idéias.
"Meu corpo é a materialização daquilo que me é próprio,
realidade vivida e que determina minha relação com o mundo
(...). Sensações de vazio, de plenitude, de turgescência, mas
também um ardor ou sua queda, o sentimento de uma ameaça ou, ao contrário, da segurança íntima (...), alegria ou pena
provindas de uma difusa representação de si próprio."
É preciso muita coragem para um historiador dizer algo
dessa natureza nos tempos
opressivamente escritos em
que vivemos e em que o corpo
parece ficar de fora das considerações científicas, por incrível que pareça.
A performance é um reconhecimento, uma concretização do corpo, de si e do outro,
no aqui e no agora da voz. Dos
repentistas brasileiros (que
Zumthor estudou a fundo) aos
"griots" de Burkina Fasso, passando pelos "rakugokas" do Japão, o indivíduo em atitude
performática se coloca integralmente naquela situação e
estabelece, com quem realiza o
pacto proposto pela voz, uma
comunhão laica.
A poesia é, segundo o autor,
uma "ritualização da linguagem"; e a poesia vocalizada,
"performatizada", pode vir a
ser também uma libertação da
palavra de sua duração cronológica, inserindo-a num outro
tempo: o tempo concreto, do
ato, do agora que passa, mas
que se sustenta pela potência
de sua autenticidade.
PERFORMANCE, RECEPÇÃO,
LEITURA
Autor: Paul Zumthor
Tradução: Jerusa Pires Ferreira e
Suely Fenerich
Editora: Cosacnaify
Quanto: R$ 29 (128 págs.)
Avaliação: ótimo
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