São Paulo, terça-feira, 14 de agosto de 2007

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Cultura game

Bilionária e em constante crescimento, a indústria dos videogames interage com outras áreas e influencia mudanças de comportamento e de padrões no cinema, na música e na moda

Cada vez mais avançados na técnica, no visual, no roteiro e na trilha sonora, os games já são considerados "arte" e comparados a Hollywood

Nick Ut - 9.mai.2006/Associated Press
Funcionária da feira norte-americana de videogames E3 (ao centro) prepara cenário para o evento


MARCO AURÉLIO CANÔNICO
DA REPORTAGEM LOCAL

Quinze anos depois do original, o diretor John Woo, mestre dos filmes de ação, está lançando, neste mês, uma seqüência para seu célebre "Hard Boiled", retomando a parceria com o ator Chow Yun-Fat. A obra se chama "Stranglehold" e desperta a atenção por um detalhe: não é filme, é um videogame.
A produção de Woo (que tem site, www.strangleholdgame.com, e trailer como qualquer filme) é apenas o exemplo mais atual da crescente mistura entre a indústria dos games e as do cinema, da música, da moda.
Esta interação não é casual: os videogames são um mercado bilionário e em expansão, que já ultrapassou há alguns anos o faturamento da indústria cinematográfica e, segundo analistas, pode passar já no próximo ano a fonográfica.
"Um jogo de ponta hoje leva dois anos para ser desenvolvido, consome dezenas de milhões de dólares e ocupa um grupo de 70 pessoas que inclui produtores, programadores, músicos, atores, roteiristas. Em certo sentido, é a nova Hollywood", afirma o jornalista britânico Steven Poole, em seu livro "Trigger Happy".
Mas não é apenas o dinheiro que impulsiona a convergência: cada vez mais avançados tecnicamente, em visual, roteiro e trilha sonora, os games vêm sendo enquadrados por seus defensores como "arte".
"Sejam quais forem os critérios que se utilize para definir "arte", eles podem ser encontrados nos videogames hoje em dia", afirma o especialista Mark Wolf, autor de inúmeros livros teóricos sobre a mídia, em entrevista à Folha.
"Os jogos mudaram as concepções padronizadas das demais artes. As pessoas querem coisas mais rápidas e com avanços constantes."

Interação e liberdade
Inicialmente um subproduto do desenvolvimento tecnológico da Guerra Fria, os videogames passaram à ponta-de-lança da indústria cultural graças a duas características que se adaptam com perfeição aos tempos modernos: a interatividade e a liberdade que permitem ao usuário.
"Permitir às pessoas criarem seu próprios filmes e jogos é o caminho do futuro", defendeu Henry Jenkins, chefe do programa de estudos de mídia comparada do Massachusetts Institute of Technology (MIT), em um especial do canal Discovery sobre games.
"A indústria dos games entendeu isso mais cedo do que as demais. Quando as gravadoras estavam processando seus consumidores [por baixarem músicas ou utilizarem samples], os fabricantes de jogos estavam dando ferramentas para que seus usuários criassem e dividissem com os outros."
Com tal aval para criar, os jogadores não apenas desenvolveram novas fases e novos jogos, mas passaram a fazer seus próprios filmes com cenas dos games (chamados de machinima) e também suas músicas.
Uma pesquisa na internet identifica inúmeras bandas (brasileiras, inclusive) que fazem versões das trilhas de jogos clássicos como "Castelvania" em diversos gêneros (heavy metal, folk, rap etc.).
Há ainda um projeto erudito, o Video Games Live, em que uma orquestra adapta canções (e cenas) de jogos como a série "Mario Bros." para o formato clássico. A idéia será novamente encenada no Brasil no próximo mês, e registrada em DVD.
Também recentemente os jogos, personagens e consoles clássicos deixaram de ser apenas estampas de camisetas e passaram a gerar moda própria.
A grife londrina Cassette Playa buscou nos jogos o design para as roupas da geração "new rave". Em entrevista à Folha em dezembro, a estilista da marca, Carri Mundane, 26, disse que suas criações refletem "uma pessoa que passa muito tempo jogando (...) e acaba se tornando parte do game: adquire novas cores, modifica seu corpo, vira um personagem".


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