|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CINEMA
Ciclo revê maestria de Ozu e Mizoguchi
De hoje a 23/8, Centro Cultural São Paulo exibe dez longas de dois grandes nomes do cinema japonês do século 20
Os dois cineastas só não ficaram tão conhecidos como Akira Kurosawa porque tiveram difusão internacional limitada
CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA
O Japão é um país cujo cotidiano é conhecido por registrar
abalos sísmicos de menor e
maior intensidade. Também é
onde nasceram e construíram
obras imponentes e influentes
dois cineastas capazes de traduzir os tremores da alma à altura da escala cinematográfica.
Quando se fala em cinema japonês, o nome de Kurosawa
costuma ser o de lembrança
imediata. Mas, sem que seja
preciso recorrer a competições,
os filmes de Yasujiro Ozu
(1903-1963) e de Kenji Mizoguchi (1898-1956) só não se tornaram mais conhecidos porque ficaram sujeitos a uma difusão
internacional limitada.
Com um ciclo de hoje a 23/8,
o CCSP exibe dez longas (cinco
de cada diretor) que demonstram a sensibilidade de sismógrafo desses dois mestres.
Apesar de não trazer raridades (o título mais antigo é "Filho Único", um Ozu de 1936), a
mostra cobre o período tardio
das obras de Ozu e de Mizoguchi, no qual seus estilos já se haviam consolidado, e é mais que
suficiente para justificar o culto
a eles devotado por cinéfilos.
Ozu é reconhecido pelo minimalismo dos temas e da forma,
com suas crônicas do cotidiano,
quase sempre focadas nos laços
familiares. Com um estilo despojado, o cineasta fez do uso da
câmera baixa e fixa um efeito
de assinatura. Em cenários domésticos dominados pela regularidade das linhas e pela geometria ordenada dos objetos, os pequenos dramas de seus
personagens emergem com toda a força de sua humanidade.
Com essa opção, as pequenas
mutações da vida são percebidas em sua devida relevância.
Seus retratos capturam os
efeitos das transformações de
costumes de um Japão moderno e urbano e traduzem o impacto das transformações na
vida dos indivíduos. Nesse sentido, seu cinema é um sismógrafo que registra os mínimos
tremores, as vibrações de baixa
intensidade, elevando o banal à
altura da poesia.
Já Mizoguchi recuou, muitas
vezes, a outros períodos históricos para afirmar o pessimismo essencial de sua visão de
mundo. Seu tema mais freqüente são os efeitos dos imperativos morais e sociais no destino, quase sempre funesto, de seus personagens. Consagrado
como um cineasta da alma feminina, seus retratos muitas
vezes protagonizados por mulheres são de fato estudos reveladores da universalidade da
crueldade humana, movida pela ambição, pelo egoísmo e pela
sede de poder.
O diretor foi também um
imenso construtor de formas,
com uma ênfase particular no
uso da luz e dos movimentos de
câmera, como no assombroso
epílogo de "Contos da Lua Vaga...", em que a câmera atravessa o reino dos vivos até o mundo dos mortos e retorna. Seu cinema se constitui por grandes
abalos, cujos impactos só deixam destruição e morte.
MIZOGUCHI & OZU
Quando: de hoje a 23/8
Onde: Centro Cultural São Paulo (r.
Vergueiro, 1.000, tel. 0/xx/11/3383-3402)
Quanto: entrada franca
Texto Anterior: Bernardo Carvalho: "Moça num vestido velho" Próximo Texto: 54 filmes de Mizoguchi se perderam Índice
|