São Paulo, sábado, 14 de agosto de 2010

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Brasil vê o impacto de Beckett em peça de Bob Wilson

Renomado diretor americano monta "Dias Felizes" em Belo Horizonte e Porto Alegre e diz que texto marcou toda a sua carreira

MARCOS GRINSPUM FERRAZ
DE SÃO PAULO
CHRISTIANE RIERA
CRÍTICA DA FOLHA

A afinidade sempre existiu. Seja na economia da linguagem, no desprezo pela narrativa convencional ou no jogo dialético entre tempo e espaço como recurso teatral, o trabalho de Robert Wilson sempre se relacionou com a obra de Samuel Beckett (1906-1989).
Ainda assim, foram precisos quase 40 anos de carreira para que o diretor americano decidisse montar um texto do dramaturgo irlandês.
"Sempre houve muita gente que me pediu para fazer Beckett. Mas eu sentia que a proximidade entre nosso trabalhos era tanta que resolvi esperar. Até que dois anos atrás tive duas ofertas e achei que tinha chegado a hora de encarar o desafio. Então, eu fiz", explica Wilson, 77, em entrevista à Folha por telefone, dos EUA.
Foram duas peças de uma vez: "A Última Gravação de Krapp", em 2009, e, no ano anterior, "Dias Felizes", que chega ao Brasil pela primeira vez com apresentações hoje e amanhã no Festival Internacional de Teatro Palco e Rua de Belo Horizonte (www.fit bh.com.br/2010). De lá, segue para Porto Alegre.
No palco, a atriz italiana Adriana Asti -dos filmes de Buñuel, Pasolini e Bertolucci- faz o já clássico papel de Winnie, a mulher eternamente otimista e falante que, mesmo enterrada até a cintura, não se deixa abater em sua resistente rotina.
Uma das novidades da montagem de Wilson é a substituição do monte de terra do cenário proposto em Beckett por asfalto. Da natureza para a cidade.
Ao contar sobre a escolha de montar esta obra, ele aproveita para lembrar de quando conheceu Beckett.
"Quando me apresentei em Paris pela primeira vez, em 1971, a excelente atriz francesa Madeleine Renaud estava lá encenando "Dias Felizes". Eu a conheci e, por meio dela, Beckett. Então a peça sempre causou um grande impacto em mim. E acho que influenciou todo o trabalho que fiz a partir daí."
"Todo o trabalho", no caso de Wilson, não é pouco. São montagens que vão de Shakespeare a contemporâneos como Heiner Müller; de Umberto Eco a poetas concretistas como Christopher Know- les; e, na música, de óperas de Wagner a parcerias com Lou Reed e David Byrne.
Sobre o maior reconhecimento desta vasta produção fora de casa, ele diz: "O teatro nos EUA é um teatro mais de boulevard, voltado ao entretenimento e ao turismo".
E aproveita para alfinetar a "cegueira" americana frente ao mundo. "Não sabemos o que está acontecendo no teatro do Brasil ou de Paris, Roma e Berlim. Somos completamente desconectados."
Próximo aos 80 anos e em plena atividade, com 14 projetos em andamento, Wilson revela também um pouco de seu trabalho como educador no centro que criou em Long Island: "Não quero uma escola à la Bob Wilson ou um jeito Bob Wilson de fazer coisas. Gosto de diversidade".


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