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SHOW CRÍTICA
"É o Tchan" faz matinê para crianças assanhadas
MARCELO RUBENS PAIVA
especial para a Folha
Não existe banda mais erotizada que "É o Tchan". Em seu disco
"É o Tchan no Havaí", havia 11
músicas que tinham uma referência ao traseiro feminino. As mulheres eram tratadas pelos codinomes "ordinária" e "safada".
Eram.
No novo álbum, "É o Tchan na
Selva", contei, por alto, apenas
quatro referências ao popô feminino. E os cantores Beto Jamaica e
Compadre Washington mostram-se mais gentis. Em quase todas as letras, há a presença dos
verbos subir e descer impregnados de duplo sentido. "E na sacanagem, vai pegando no ponteiro,
vai descendo até em baixo, vai subindo bem ligeiro...", diz a música
"Trim Trim".
As dançarinas da banda já estiveram em pêlo em pelo menos
cinco edições da revista "Playboy" em que foram capa. Aliás, a
edição de setembro da revista é
com as dançarinas atuais, Scheila
Carvalho e Sheila Mello. É patética a foto em que as duas sorriem e
arrebitam os bumbuns que contribuíram para a venda de 10 milhões de discos. O que mais não
está à venda nesta banda peculiar?
"Faz aparecer a marquinha, faz
aparecer a bundinha, faz aparecer, danadinha", cantam os patrões Beto e Compadre ("Abra
Cadabra").
Esperava-se, então, que a banda
circulasse pelos garimpos e boates da boca-do-lixo. Nada disso.
Faz shows em casa de prestígio,
como o último, na Via Funchal, e,
curiosamente, apresentam sessões matinê, para o público infanto-juvenil, antes do sol se pôr.
E muitas criancinhas assanhadas compareceram, imitaram as
danças, rebolaram, sacolejaram
os quadris, algumas (porque 95%
eram meninas) imitavam direitinho, outras eram um desastre.
Muita criança. Pré-adolescentes.
Levadas pelos pais. Tudo brincadeirinha?
Não precisa ir muito longe para
descobrir que o brasileiro é um
povo diferente. Não existe um
discurso coerente que explique o
sucesso desta verbalização maliciosa e transparente. Não existe
uma pesquisa séria que aponte os
benefícios ou prejuízos de uma
sensualização precoce. Não se sabe os resultados do efeito Xuxa,
não se saberão os do efeito Tchan.
Graças a sabe lá quem, não existem mais, no Brasil, cruzadas moralistas ou passeatas de senhoras
puritanas que exigem o controle
da expressão de seu povo. Graças
a sabe lá o quê, não existe mais, no
Brasil, um órgão que exige cortes,
sugere mudanças e indica o que é
publicável ou não. É pra lá de saudável um povo que não esconde
seu corpo, cultua a beleza, a ginga,
a música, e que andou por essas
bandas peladão, durante mais de
10 mil anos.
"É o Tchan" é um negócio lucrativo. Sacou que cativava a
criançada. Infantilizou mais ainda suas letras. Seus álbuns são temáticos. O cenário do show parece um parque de diversões. Neste
último, tem elefante e coqueiros
de mentirinha.
Criança sabe muito bem onde é
o bumbum, popô, pipi etc. E "É o
Tchan" aponta para uma direção:
que arrebitar, rebolar, subir e descer é bonito e dá dinheiro. Os defensores do estilo Tchan dizem
que quem malicia são os adultos.
Mas que é estranho ver tanta menininha rebolando, é.
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