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El Rey
Com títulos como "Mi Cacharrito" e "El Dia que me Quieras", obra de Roberto Carlos em espanhol é
lançada no Brasil em duas caixas
Versões do cantor marcam o início do seu flerte com o gênero romântico; repertório internacional descartou a jovem guarda
SYLVIA COLOMBO
DA REPORTAGEM LOCAL
"Esta es una de las muchas
historias que suceden conmigo." O sotaque é tosco, mas a
frase que introduz "O Calhambeque", inconfundível. A versão "Mi Cacharrito" foi um dos
primeiros sucessos de Roberto
Carlos em espanhol.
Curiosamente, essa verdadeira carreira paralela do Rei
foi até hoje bem pouco observada por fãs, críticos e biógrafos
brasileiros. Agora, a Sony BMG
lança pela primeira vez aqui a
obra completa do Rei na língua
de Cervantes. Trata-se de um
pacote de 22 discos, com as capas originais, em duas caixas.
A primeira, que cobre o período
de 1965 a 1981, saiu em setembro, e a segunda, de 81 em
diante, chega às lojas no próximo dia 20.
Todos os álbuns foram produzidos para o mercado internacional. No Brasil, só podiam
ser encontrados em sebos e
custavam uma fortuna.
A primeira investida de Roberto no exterior aconteceu em
1965, quando lançou "Roberto
Carlos Canta a la Juventud",
uma versão do álbum "É Proibido Fumar", que saíra aqui no
ano anterior. O disco seria o
primeiro e único do conjunto
em espanhol a ter tantos ecos
da jovem guarda. A partir de
então, Roberto passou a delinear, para o exterior e para o
Brasil, uma imagem de cantor
romântico por excelência.
Sua grande virada internacional aconteceu no ano de
1968, quando venceu o Festival
de San Remo, na Itália, com
"Canzone per Te", de Sergio
Endrigo e Sergio Bardotti.
"Foi a partir desse êxito que
se deu tanto o aprofundamento
da veia romântica no Brasil como o início do flerte com o romantismo à moda latina. Àquela altura, ele já havia esquecido
o rock'n'roll e pendia para o romantismo mais desbragado,
fosse em português, italiano ou
espanhol", diz o crítico Pedro
Alexandre Sanches, autor de
"Como Dois e Dois São Cinco".
Para o pesquisador e coordenador do projeto, Marcelo
Fróes, a ausência da jovem
guarda no repertório internacional do Rei deve-se ao fato de
esta ter sido um fenômeno local. "A jovem guarda foi um
movimento nacional, a nossa
Beatlemania. Cada país teve a
sua. Roberto sagrou-se internacionalmente como cantor
romântico", diz.
Até 1976, os discos eram uma
espécie de miscelânea de canções atuais e antigas, com a evidente preocupação de apresentar um pot-pourri do universo
de Roberto, com capas diferentes das brasileiras. Daí em diante, o sucesso foi tamanho que os
discos em espanhol passaram a
trazer praticamente o mesmo
repertório e as mesmas capas
das versões em português.
À época, o cantor lançava o
disco brasileiro no Natal e, no
primeiro semestre do ano seguinte, saía o disco internacional e começava a turnê. Roberto tem álbuns editados nos cinco continentes. É também curioso notar que, no YouTube,
os primeiros clipes a surgirem
quando se digita "roberto carlos" no campo de busca são justamente os dos sucessos hispânicos ou italianos.
O espanhol deu a Roberto um
Grammy e um espaço na Calçada da Fama, em Miami, mas o
cantor nunca pareceu estar à
vontade nesse idioma. Nos primeiros álbuns, as interpretações são bem básicas e há muita
formalidade nas traduções, em
sua maioria realizadas por um
casal de amigos norte-americanos do cantor, Buddy & Mary
McCluskey. Momentos como a
canção "Una Palabra Amiga"
beiram o constrangedor ("Necesito de usted/ El momento de
hablar que será mejor usted
cambiar").
"Carnavalito" e boleros
Com o tempo, o sotaque vai
melhorando e a interpretação
vai ficando menos contida.
Mais à vontade, ele começa a
incluir músicas de vários gêneros latino-americanos.
É o caso do "carnavalito" andino "El Humahuaqueño" ou
do tango "El Dia que me Quieras", além de boleros e alguns
clássicos do cancioneiro romântico mexicano.
"Roberto foi gradativamente
se preocupando mais com uma
integração com a América Latina. Em meados dos anos 70 essa foi uma onda forte na MPB,
apanhando Elis Regina, Milton
Nascimento, Fagner, Ney Matogrosso e outros. Roberto
abriu alas para essa turma e
sempre foi o mais intenso e o
mais constante nesse esforço",
diz Sanches. "Existia uma utopia latino-americana na MPB
daquele momento. É muito
simbólico o fato de ter sido Roberto, tão freqüentemente tido
como brega e/ou americanizado, o artista que peitou a continuidade para reafirmar a identificação entre a latinidade em espanhol e a latinidade em português", conclui.
ROBERTO CARLOS PRA SEMPRE EM ESPANHOL
Gravadora: Sony/BMG
Quanto: R$ 310, em média (cada caixa
com 11 discos)
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