São Paulo, terça-feira, 14 de novembro de 2006

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Academia ganhou rigor, mas carece de vigor, diz filósofo

DA REPORTAGEM LOCAL

Há falta de atrevimento e de vigor na filosofia brasileira, afirma o professor de filosofia da USP Renato Janine Ribeiro.
Como Roberto Machado, ele diz que o método de leitura rigorosa de textos filosóficos praticado na USP nos anos 50 e 60, que privilegiava trabalhos monográficos e especializados, é hoje o modelo de cursos de pós-graduação em filosofia em todo o país.
Ribeiro lembra, no entanto, que tal método, em princípio, foi positivo. "Foi uma etapa que talvez tivesse que ter sido necessária. Qual era o contraste que você tinha no Brasil? Uma idéia de filosofia que era muito eclética, muito baseada em generalidades. Então creio que era preciso ter um rigor que foi realmente necessário", declara.
"Foi uma coisa positiva, mas trouxe algumas falhas. A área acabou dando importância demasiada à questão dos autores. A discussão de idéias é muito rara na filosofia hoje."
O problema, continua, é que "o método virou princípio". De todo modo, ele afirma que já havia na prática da filosofia daquele período, quando era aluno, "um pressuposto estranho". "Havia uma convicção de que o tempo de filosofar tinha passado."
Num livro da década de 90, "Um Departamento Francês de Ultramar" (Paz e Terra), o filósofo Paulo Arantes diz que o "Método" (assim, com maiúscula) "incluía uma cláusula restritiva severa": "deixemos a filosofia para os filósofos".
A leitura rigorosa e a análise não-dogmática dos textos tornava a falta de idéias na filosofia brasileira uma questão de método, ou, melhor dizendo, quase um objetivo do método.
"Quando muito a filosofia, se viesse, viria por acréscimo. De nossa parte, traduzíamos a lição, abrandando-a numa direção meramente profilática: visto que o mal a prevenir era o dogmatismo precoce, cumpria represar, multiplicando os anos de aprendizagem, a natural inclinação especulativa de cada um", escreve Arantes.
Embora o professor da USP Luiz Fernando Franklin de Matos também veja uma inclinação na filosofia brasileira à excessiva especialização, ele faz ponderações à crítica e aponta exemplos de casamento entre o rigor de leitura e o vigor de pensamento no país.
"Não se torna autônomo em filosofia -e falo de pessoas e países- sem referência à história da filosofia", diz. "Por outro lado, é fato que isso pode gerar excesso de especialização."
Franklin de Matos cita os colegas Bento Prado Jr. e Marilena Chaui como exemplos de filósofos brasileiros que, debruçando-se com rigor sobre a história da filosofia, foram capazes de serem criativos e apresentarem idéias inovadoras.
"No seu estudo magistral sobre Espinosa, Marilena não o toma como um fim, mas, por meio dele, coloca problemas novos, da relação entre filosofia e história, e entre filosofia e política", exemplifica. (RC)


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